Com o desembarque dos técnicos estrangeiros no país, cresce o número de times interessados em resgatar o que o futebol brasieliro zelava nos tempos românticos: a saída com toque de bola desde a defesa, em vez de chutões e ligações direta da defesa ao ataque. Estratégia reinventada pelo técnico argentino Ricardo La Volpe à frente da seleção do México na Copa do Mundo de 2006, e popularizada por Pep Guardiola.
Auxiliar do técnico catalão no Barcelona, Bayern e Manchester City Domènec Torrent explora o recurso no Flamengo. O gringo Jorge Sampaoli, também, no Atlético-MG. Hoje, o time carioca e o mineiro submetem a nem sempre segura opção tática aos jurados, às 18h15, no Mineirão, no principal duelo da abertura do segundo turno do Brasileirão.
A Liga dos Campeões da Europa aponta que a tendência de saída com bola na base do toque está enraizada no Velho Mundo. Relatório técnico da Uefa aponta que, na edição 2019/2020, 24% das saídas foram com bolas curtas. Finalistas, PSG e Bayern são os que mais utilizaram o recurso: 45% e 42% dos reinícios, respectivamente.
“No total, houve seis gols marcados de movimentos que começaram com tiro de meta curto para jogador dentro da área — e 44 chutes dessas sequências de jogadas”, descreve o relatório. A saída da zaga com a bola no chão exalta a qualidade do futebol, mas pode ser fatal na perda de bola. O levantamento da Uefa mostra, ainda, que a marcação alta do adversário costuma complicar as saídas curtas. Ocasionou 1.148 erros. Desses, 217 acabaram em conclusões à meta e 30 em gols marcados.
Expoente da nova safra de técnicos do futebol do Distrito Federal, Hugo Almeida é um dos defensores da reposição com o controle da bola. Na visão do treinador, membro do sub-16 do Sporting de Lisboa, essa é a maneira mais eficiente de envolver o adversário, encontrar espaços no campo e progredir até o gol adversário. Porém, ele destaca que, conforme o contexto da partida, também não se opõe a utilizar lançamentos longos para aproveitar as brechas.
Para Hugo, a segurança em ter a bola dominada é maior do que em disputa, como ocorre nas chamadas ligações diretas. “Há um maior envolvimento e possibilidade de movimentação, desorganização e desestruturação do sistema defensivo adversário, aclarando muito mais espaços e possibilidades de chegada ao gol adversário”, opina.
Risco
Mesmo defensor do modelo, o treinador campeão da segunda divisão do Candangão 2018 com o Capital ressalta alguns pontos negativos de iniciar as jogadas com passes curtos. “O fato de a equipe, geralmente, estar em zonas próximas à própria meta e em situações de desequilíbrio fazem com que o menor erro cometido dê ao adversário oportunidades mais claras para marcar”, salienta. Atlético e Flamengo sofreram gols recentes em falhas na saída de bola.
Minimizar os erros, segundo Hugo, está atrelado ao trabalho e à confiança. “A repetição, acompanhada de feedbacks por parte do treinador e da equipe técnica, levam ao aprimoramento e à evolução na execução da tomada de decisão assertiva”, explica. Para Hugo, todo o sistema defensivo é primordial na construção de jogadas com bola no pé. “O papel não é meramente enfeite ou capricho.”
Vilson Tadei, técnico do Gama, se diz a favorável a tudo que é futebol bem-apresentado, “desde que o jogador tenha confiança para fazer, principalmente o goleiro, que é o desafogo nesse tipo de jogada”.
Comandante do bicampeão candango , ele usa o Flamengo como exemplo. “O elenco é extremamente habilidoso, experiente e com jogadores de nível de Seleção Brasileira, com muita confiança. Mesmo assim, quando pega um adversário muito bom e que marca bem, pode cometer erros.”
A confiança é classificada por Tadei como crucial para colocar em prática a saída de bola de pé em pé para não se apavorar com uma marcação mais alta que pressione o erro. “Agora, tudo é assim, os times marcam na linha alta. Quisera eu jogar nessa linha alta, porque eu não tinha medo”, comenta Tadei. Ex-jogador, ele atuou como meia nas décadas de 1970 e 1980, sagrando-se campeão brasileiro como camisa 10 do Grêmio em 1981. Treinador desde 1991, ele ressalta as condições dos gramados na atualidade. “O sair jogando e usar o goleiro como se usa no futebol de salão é muito legal, principalmente hoje, com gramados uniformes, que propiciam esse tipo de jogada”, observa.
18h15
Mineirão Belo Horizonte
Brasileirão 20ª rodada
Transmissão pay-per-view
Atlético-MG
Everson; Mariano (Guga), Alonso, Réver e Arana; Jair, Allan, Nathan, Savarino, Keno; Sasha (Marrony)
Técnico: Jorge Sampaoli
Flamengo
Hugo Souza; Isla, Gustavo Henrique, Natan e Filipe Luís; Arão, Thiago Maia, Gerson e Everton Ribeiro; Bruno Henrique e Pedro
Técnico: Domènec Torrent
Árbitro: Sávio Pereira Sampaio (DF)