É através do descanso que o cérebro e o corpo se recuperam do estresse acumulado durante o dia, os tecidos neurais são reparados e a memória é consolidada. No entanto, cada um tem sua realidade: alguns conseguem ter um sono de qualidade durante toda a noite, enquanto outros podem chegar a passar longas horas sem "pregar o olho".
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Mas, é inegável que uma boa noite de sono garante qualidade de vida e promete um ótimo desempenho nas atividades diurnas. Pelo contrário, quando não se dorme bem, no dia seguinte pode-se parecer sonolento e desatento, e, com o tempo, a predisposição para desenvolver doenças aumenta.
Em contraste com essa realidade, dados colhidos entre 2018 e 2019 pela Associação Brasileira do Sono (ABS), mostram que a população brasileira está dormindo menos. De 6,6 horas por dia em 2018, a quantidade de horas de sono por dia caiu para 6,4, em 2019.
Acontece que nos últimos tempos, “o sono perdeu prestígio”, segundo a médica neurologista especializada em sono da Unidad de Medicina del Sueño de Fleni, Agustina Furnari. Hoje, dorme-se entre uma e duas horas a menos do que há 50 anos. E o motivo tem a ver com a mudança de estilo de vida.
— Questões relacionadas com a adrenalina diária, com a carga de trabalho exigida e com uma vida social ativa, fazem com que tenhamos menos horas para descansar, afirma a especialista.
E esta situação é claramente evidente na sociedade brasileira. De acordo com uma pesquisa publicada na revista Sleep Epidemiology (Epidemiologia do Sono, em tradução do inglês), cerca de 66% dos brasileiros dormem mal e, entre esses, as mais afetadas são as mulheres, que podem ter um sono até 10% pior do que o dos homens.
Dormir é uma necessidade universal e inevitável, mas vários fatores devem ser levados em conta para promover ou não um bom descanso.
Curiosidades
1) Como surgiu a cama?
Os registros indicam que a primeira cama remonta à Idade da Pedra, há 227.000 anos. Esses dados foram revelados pela revista Science. Uma investigação descobriu que em Border Cave, uma caverna na África do Sul, havia indícios do uso de camas. Os pesquisadores estimam que essas comunidades buscavam um local para se proteger de insetos e pragas, enquanto tentavam manter a ordem no espaço. Essas camas foram construídas com grama e cinzas.
Mais tarde, os gregos e os romanos adotaram as camas e deram-lhes um caráter multifuncional: não só dormiam, como também comiam. Nos tempos medievais, na Europa, já era costume dormir reclinado sobre algum artefato: as pessoas de baixa renda o faziam sobre palha e feno, enquanto os ricos mandavam construir camas grandes, como símbolo de luxo. Naquela época, independentemente da classe social, as camas eram comunitárias: ali também descansavam famílias inteiras e, às vezes, hóspedes.
Os anos foram passando e alguns hábitos, mudando. Nos tempos modernos, as camas passaram a ser usadas por uma ou duas pessoas, e eram sinônimo de opulência e riqueza. Os monarcas, como por exemplo Luís XIV, da França, as encomendavam com designs luxuosos e enormes. O material preferido era a madeira, mas, ao longo dos anos e por questões de higiene, esse material foi gradualmente substituído pelo ferro.
Atualmente, as camas fazem parte do mundo privado das pessoas e são vistas como um espaço de descanso, confortável e que gera prazer.
2) Quantas horas de sua vida uma pessoa dorme?
— Cada faixa etária tem a quantidade de horas recomendada, mas, em média, recomenda-se que os adultos durmam em média oito horas por noite. Isso significa que uma pessoa dorme um terço de toda a sua vida.
3) Como não caímos da cama?
Ao longo da vida desenvolve-se a propriocepção: o cérebro aprende a tomar consciência do corpo e da dimensão dos espaços.
— Assim, inconscientemente, sabemos até onde vai a cama e como se movimentar para não cair, explica Furnari.
4) É bom dormir com protetor de ouvidos e máscara?
Para Furnari, embora seja um hábito válido, adotado por um grande número de pessoas, principalmente as que moram em grandes cidades e são sensíveis à luz e ao som, "o ideal é manter as condições naturais na hora de dormir e adaptar o quarto para evitá-lo”. E acrescenta que o importante é garantir um local adequado para descansar bem: fresco e escuro.
Mitos
“Alguns copos de álcool para relaxar antes de dormir”
Embora o álcool possa ajudar a adormecer mais rapidamente, já que pode ter um efeito sedativo, a verdade é que a longo prazo "gera um sono de má qualidade, superficial e fragmentado", alerta a médica neurologista do Hospital Italiano e presidente da Associação Argentina de Medicina do Sono, Stella Valiensi.
Acontece que esses tipos de bebida, segundo Furnari, “são predadores do sistema nervoso central”. Ela explica que, nas primeiras horas da noite, quando ainda há álcool no sangue, o mais provável é que a pessoa adormeça profundamente, mas sem sonhar. Isso porque, o álcool age sobre o ácido gama-aminobutírico, um neurotransmissor que inibe os impulsos entre as células nervosas e promove a calma. Porém, quando o nível de álcool no sangue cai, o cérebro começa a acelerar e a qualidade do sono é perdida.
Furnari também conta que o álcool funciona como um diurético. Sendo assim, o consumo em excesso pode fazer com que a pessoa acorde no meio da noite com a bexiga cheia. A especialista em sono sugere ingerir pouco líquido e concentrado. Por sua vez, recomenda alimentos ricos em triptofano, componente que gera a melatonina, o hormônio do sono. Entre eles cita o kiwi, a banana e o leite.
"Eu assisto TV até pegar no sono"
De acordo com as especialistas consultadas, o quarto deve ser reservado para dormir e que o restante das atividades deve ocorrer fora dele.
— O ideal é desligar os aparelhos eletrônicos uma hora antes de dormir, pois as telas emitem uma luz que suprime a secreção de melatonina, esclarece Furnari.
Porém, "para muitas pessoas, a televisão funciona como um remédio para dormir", aponta Valiensi. Apesar disso, a neurologista recomenda tomar cuidado com o conteúdo que se assiste, porque quando se trata de violência ou terror, "pode alterar e gerar adrenalina”, sugerindo que o melhor é assistir a filmes ou séries calmas e relaxantes.
Rolar na cama por não conseguir dormir é comum. No entanto, as especialistas revelam que é preciso levantar.
— Se você ficar na cama sem dormir, pode gerar uma associação negativa com a cama e o quarto —, afirma Furnari. A neurologista diz que o normal é adormecer em 20 ou 30 minutos. — [Quando ultrapassado esse tempo] sugere-se mudar de espaço e ir para um local confortável, onde se possa relaxar e fazer alguma atividade para induzir o sono novamente.
Isso inclui ler com pouca luz, ouvir música suave ou realizar uma técnica de relaxamento e, quando o sono voltar, "já pode voltar para a cama", afirma Furnari.
“Eu adio o alarme por mais cinco minutos”
Essa circunstância que parece agradável, no final é contraproducente. Acontece que o sono é composto por duas fases: a conhecida como "não-REM", onde o sono é leve, e depois a "REM", onde há sono profundo e o movimento rápido dos olhos. Todo o processo dura entre 80 e 100 minutos e estima-se que sejam realizados de quatro a seis ciclos por noite. Portanto, o problema de adiar o alarme é que a pessoa entra novamente no processo do sono, e interrompê-lo “faz com que ele não siga seu curso normal e a pessoa acorde mais cansada”, destaca Furnari .
Nesse contexto, outra questão é descrita por Valiensi como “o perigo de continuar a dormir”, já que “esses cinco minutos podem transformar-se em uma hora”. Por isso, ela insiste na importância de manter uma rotina na quantidade de horas de sono e de permanecer na cama.
Para a neurologista, há também o “jet lag social”.
— As pessoas são muito ativas durante a semana e aos fins-de-semana tentam compensar as horas de sono, mas a verdade é que o descanso é uma rotina e não se deve ultrapassá-lo duas horas extras compensatórias, porque nosso cérebro não está acostumado a dormir tanto, então, para algumas pessoas, essas horas podem fragmentar o sono, diz Valiensi.
“Eu ronco porque durmo profundamente”
Para as especialistas, o ronco ocasional é universal. Porém, quando é persistente, intenso e impacta o dia-a-dia, “é motivo para acender o alerta”, aponta Valiensi. A neuro explica que, às vezes, o ronco pode ser ocasionado por patologias como apneia do sono ou microdespertares.
Nessa linha, a neurologista aconselha dormir de lado, principalmente o esquerdo. Assim, haverá menos colapso da via aérea e haverá melhor drenagem linfática do cérebro e motilidade gastrointestinal. Ela revela ainda que “a pessoa ronca mais quando dorme de barriga para cima”.
Dessa forma, existem muitos fatores que entram em jogo durante o sono. Combiná-los para dormir de maneira saudável e bem-sucedida evitará desconforto no dia seguinte e garantirá uma ótima qualidade de vida.