Beatriz Bezerra de Aragão é irmã de Antônio e de Catarina, vive hoje aposentada na cidade de São José do Egito.
Apesar de ter deixado há tempo o serviço público, na condição de professora, carrega ainda na alma todos os trejeitos de quem passou boa parte da sua vida tecendo poemas de amor à vida, de giz e apagador na mão, diante de um quadro negro, tão negro quanto o futuro, seu e daqueles sertanejinhos pobres a quem procurou ensinar a ler e escrever com a intenção de colocá-los num mundo melhor, onde alguns poucos teriam a parte que lhes caberia nas fábricas, vilas e favelas daquela imensa e tenebrosa São Paulo, sumidouro de almas nordestinas.
Beatriz faz parte de um gênero onde nascem poucos exemplares. Como todo agente de educação, leva uma vida modesta cercada pelos filhos, netos e muitos amigos. Não aparenta tristezas, apesar dos catabios da sorte e vai “tangendo as suas cabrinhas” com toda aquela serenidade da eterna professorinha primária que sempre foi.
Ela seria muito bem, aquela Irene, do poema de Manoel Bandeira, “Irene no Céu”:
“Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor
Imagino Irene chegando no céu e pedindo a São Pedro:
– Com licença, meu branco!
– Você não precisa pedir licença, Irene – Pode ir entrando!”…
Mas fica só na comparação, pois tenho certeza de que ela não quer ser chamada pelo pessoal de lá de cima nem tão cedo.
Da sala de aula, além da imensa lição de vida, Beatriz guardou, com cuidado e carinho, histórias que viveu na rica convivência com o povo do mato, gente simples, pobre e exuberantemente sábia.
Uma vez na aula de religião, Beatriz perguntou aos meninos:
– Vocês sabem quem é que pode mais do que Deus?
Ninguém se atreveu a responder, até que lá do fundo da sala veio a voz ainda muito fina, porém determinada:
– Eu sei, professora!
– Então diga, quem pode mais do que Deus!
– É o jumentinho daquela história que a senhora contou, que carregou Nossa Senhora e o Menino Jesus!