Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Raimundo Floriano - Perfis e Crônicas quinta, 05 de maio de 2022

BARBOSINHA, UM AMANTE DA BOA MÚSICA
BARBOSINHA, UM AMANTE DA BOA MÚSICA

(Publicada a 01.08.2014)

Raimundo Floriano

 

 

Barbosinha: 05.05.1934 – 20.07.2014

 

                        Cesário Barbosa Bonfim, o Barbosinha, filho de Jonas Ferreira Bonfim e Maria Aracy Barbosa Bonfim, nasceu em Independência (CE), no dia 5.5.1934.

 

                        Em janeiro de 1944, quando eu estava com 7 anos e meio, a Família Bonfim mudou-se para Balsas, trazendo o Barbosinha, filho mais velho, e duas lindas meninas, a do meio, Leonor, e a mais novinha, Maria Núbia, regulando minha idade, pela qual, à primeira vista, fiquei perdidamente apaixonado, demonstrando meu amor com beliscões, tapas e puxões de cabelo. Esse romance unilateral durou só até o fim da Segunda Guerra Mundial, quando ficamos para sempre intrigados.

 

                        Em Balsas, Barbosinha estudou no Grupo Escolar Professor Luiz Rêgo, concluindo o Primário em dezembro de 1947, após o que embarcou numa balsa, rumo a Floriano, para cursar o Ginásio, daí partindo para outras plagas até formar-se em Direito e conquistar, mediante aprovação em concurso público, o cobiçado cargo de Fiscal de Tributos do Estado de Goiás e do Tocantins. De Balsas para o Mundo, como soía acontecer com todo garoto pobre que desejasse progredir na vida.

 

                        Arguto obeservador, de tanto viajar nas balsas, escreveu bela crônica sobre essa rústica embarcação, da qual me vali, com sua autorização, para ilustrar meu texto sobre a navegação fluvial de Balsas para o Oceano Atlântico.

 

                        Em Balsas, Seu Jonas exerceu as atividades de Promotor de Justiça e Agente da Companhia Serviços Aéreos Cruzeiro do Sul.

 

                        A Agência da Cruzeiro foi um dos locais mais paquerados da cidade naquele tempo. Era onde se compravam passagens, e onde se despachavam as bagagens a embarcar e se recebiam as encomendas que chegavam, além dos carretéis com os filmes a serem exibidos no Cine Santo Antônio, a cargo do projecionista Zé Farias. Diante da algazarra que os curiosos e desocupados faziam, Seu Jonas não teve outro jeito senão afixar estas duas placas na parede atrás de seu birô:

  

                        Os Bonfim eram grandes consumidores de palmas, roscas, cacetes, brevidades e biscoitos que Dona Maria Bezerra, minha saudosa mãezinha, fazia e me mandava vender na rua, deixando-me na maior saia-justa quando chegava na casa daquela família, morrendo de vergonha das duas meninas.

 

                        Em meados do século passado, surgiu riquíssimo Eldorado na região norte-goiana, hoje norte-tocantina, com terras devolutas, água farta, chovendo no tempo certo, atraindo nordestinos da periferia, que para ali acorreram na busca de vida melhor para si e suas famílias. Assim, em 1952, Seu Jonas e Dona Aracy mudaram-se em definitivo para Itacajá, onde ele assumiu o cargo de Administrador do Serviço de Proteção aos Índios - SPI, atual FUNAI.

 

                        Enquanto as meninas permaneceram em Balsas, para darem continuidade aos estudos, Barbosinha pontificava por aí, alhures e algures, na busca da conquista de seu espaço no mercado de trabalho.

 

                        Em 1956, ele foi visitar os pais em Itacajá, pretendendo ficar poucos dias, o que não conseguiu. Ali, enraizou-se e constituiu família, casando-se, em 25.7.1962, com a itacajaense Dulce Soares Bonfim, com quem teve os filhos Jonas, Sandra, Cláudia, Flávio, Stella e Cesário.

 

Barbosinha e Dulce 

                        Nas horas vagas, atuava como locutor da amplificadora Voz do Sertão, difundindo a Música Popular Brasileira em algo grau, pois os sons de seus alto-falantes alcançavam todos os recantos da cidade. De sua cabeça, saiu o nome do futuro município de Itapiratins, combinação de Ita, primeira sílaba de Itacajá, e piratins, parte final de Tupiratins, cidade vizinha.

 

                        Sua cartada genial veio em 1968, quando ele, Coletor Estadual, e João Pinheiro, Fiscal Arrecadador do Estado, juntamente com próceres da cidade, fundaram o Ginásio Progresso de Itacajá - GPI, possibilitando aos filhos daqueles colonos o estudo sem terem de buscá-lo em outros centros mais adiantados. Iniciado o primeiro ano letivo, Barbosinha tornou-se professor de História e OSPB.

 

                        Mas não parou aí a devoção de Barbosinha por Itacajá. Em 2011, ele a homenageou com este preciosíssimo documento:

  

                        O livro conta a história de Itacajá, desde o início do povoamento, por volta de 1900, com nomes dos primeiros moradores, passando pela emancipação administrativa municipal, em novembro de 1953, e instalação em janeiro de 1954, consignando os nomes de todos os prefeitos desde então, e das primeiras-damas, com suas principais realizações. A importância desse trabalho é tamanha, que foi logo consagrado pela juventude da cidade, como demonstra a foto abaixo:

 

                        Pelo conjunto da obra, a Câmara Municipal de Itacajá deveria já ter outorgado ao Barbosinha o título de Cidadão Itacajaense. Se ainda não o fez, viajou na maionese!

 

                        Minha amizade com o Barbosinha perdura desde sempre. Começou em Balsas, quando ainda éramos crianças, continuou em Floriano, ao cursarmos o Ginásio, notadamente no ano de 1949, nas férias de julho, ao viajarmos para Balsas, ele, meus primos Pedro Ivo e João Ribeiro e eu, na carroceria do caminhão do Pedro Duarte – dois dias de poeira –, e fortificou-se mais ainda, tempos depois, com o casamento do Pedro Ivo com sua irmã Leonor. Fraternos laços de família.

 

                        Baseado nesses laços, ele me enviou, em agosto de 2012, uma solicitação deveras instigante. Sabedor que detenho um acervo fonográfico superior a 100 mil títulos, pediu-me que gravasse para ele a trilha sonora dos principais momentos de sua vida, 296 peças, com esta justificativa:

 

“Desde muito cedo na vida, passei a apreciar a boa música, em todas as suas modalidades, variantes e formas. Creio que isso teve início, com as canções maternas que me embalaram nos primeiros sonos. Mais tarde, com as mudanças de idade e gostos, fui sentindo que cada etapa, se fazia acompanhar por uma trilha musical, sempre presente, nos devaneios e fantasias, como expressão máxima de meus sentimentos, embelezando cada momento de minha maneira de ser e de viver.

 

“Senti, desde que tomei conhecimento de alguma das melhores coisas da vida, que, a determinadas pessoas, a natureza concedeu dons especiais, justificando-se, dessa forma, a existência dos artistas, músicos, poetas, escritores, compositores e intérpretes, capazes de levar, aos demais viventes menos dotados, a beleza de suas artes e, especialmente, dos sons que, associados à poesia das letras, envolvem a nós outros, apreciadores, conduzindo-nos à importante tarefa de aplaudi-los e transformá-los meritoriamente em nossos ídolos. Foi assim que nasceu a figura do “fã”, provavelmente derivada da palavra fanático.

 

“São grupos distintos, porém integrados entre si. Um depende do outro. Que seria do artista se não tivesse ninguém que apreciasse o que faz? Roberto Carlos resume isso numa estrofe, quando se apresenta ao seu público: ‘Quando eu estou aqui eu vivo esse momento lindo’. Esse momento é dividido com todos aqueles que gostam dele e de sua música.

 

“Nisso tudo, o peso de nosso valor de ouvinte é incomensurável, pois somos uma imensa maioria e, sem o nosso apoio e aplauso, não tinha significado a existência dos artistas. Quem não gostaria de ser privilegiado com um desses dons que parecem até divinos? Contudo, satisfazemo-nos em aplaudir quem os possui, fazendo de seus sucessos o nosso próprio sucesso, levitando às suas sombras. Talvez seja por isso, que Ruy Barbosa tenha dito, como uma grande vantagem: ‘Não canto nem pinto, mas revejo e recordo’.

 

“Pertenço a esse imenso grupo. E foi justamente pensando assim que resolvi juntar minhas preferências musicais, através dos tempos, sem contar com os clássicos que, por falta de audiência, apenas aprecio aqueles mais divulgados e popularizados. Minha trilha musical, como creio que cada apreciador de música deve ter a sua, é essa que segue e que constantemente gosto de ouvir, para sentir-me vivo.

 

“Foi assim que selecionei as mais queridas, convertidas no que chamo de trilha musical, inserida nas diversas fases de minha vida, ocorridas, no Ceará, Maranhão, Piauí, Goiás e Tocantins, locais por onde passei, nas andanças da vida. E, como na vida tudo também passa com rapidez incrível, só as boas recordações ficam, e a música é uma delas, por estar geralmente associada a esses bons e inesquecíveis momentos.”

 

                        A Trilha Musical do Barbosinha, como ele bem frisou, contempla todas as localidades por onde passou, amarrando os períodos em que ali viveu, constituindo-se na história de sua vida: Independência (CE), 1939/1943; Balsas (MA), 1944/1947; Floriano (PI), 1948/1951; Fortaleza (CE), 1952/1954; Kraolândia (GO), 1956/1961; Apinagés (GO) 1962/1965; Itacajá (GO-TO), 1966/1972; Luziânia, 1973/1976; Goiânia (GO), 1977/1991; Palmas (TO), 1993/2004; e Velhos Carnavais.

 

                        Na lista, veio o samba Balsas Cidade Sorriso, de 1946, composição de Martinho Mendes e Caixeiro Viajante Desconhecido, do qual eu só possuía a letra e a partitura. Não querendo faltar com o amigo, mesmo que fosse em um só item, contratei um estúdio aqui de Brasília e concretizei a gravação. Depois de tudo providenciado, salvei as 296 faixas num pen-drive e o remeti para ele, o que foi muito de seu agrado.

 

                        Barbosinha, aos 80 anos, completados em maio passado, era um cara atualizado, por dentro, atuante, em dia com a tecnologia, com perfil no Facebook, na qual fazia postagens quase que diárias.

 

                        Além disso, era meu leitor fiel, adquirindo todos os livros que escrevi, bem como curtindo e elogiando as matérias por mim postadas semanalmente em minha coluna aqui no Jornal da Besta Fubana.

 

                        O Destino, em suas deliberações, é implacável: no dia 20 de julho passado, em Goiânia, uma embolia pulmonar fulminante levou o Barbosinha para o Plano Superior.

 

                        Para marcar musicalmente esta saudosa homenagem, escolhi duas faixas de seu pedido:

 

                        Adeus, foxe de Roberto Martins e Mário Rossi, na voz de Gilberto Alves, em 1941;

 

                        e Balsas, Cidade Sorriso, cujos créditos se encontram neste Youtube:

 

 

 


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