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Câmeras de segurança filmaram os suspeitos discutindo com as vítimas, fugindo após matarem Milton e bombeiros socorrendo o jovem, mas não flagraram a facada
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Um jovem de 19 anos, estudante de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), morreu esfaqueado na Plataforma Inferior da Rodoviária do Plano Piloto, a 2,5km do Palácio do Planalto e a 3,5km do Palácio do Buriti. O crime aconteceu por volta das 3h30 de ontem, quando a vítima esperava o ônibus para voltar para casa, no Gama. Ele estava na companhia de dois amigos, com quem havia participado de uma festa no Setor Bancário Sul (SBS). O autor da facada seria um morador de rua. Ele teve a ajuda de um amigo, segundo testemunhas.
A agressão ocorreu na Plataforma B do terminal rodoviário, ponto mais movimentado da capital, por onde circulam cerca de 700 mil pessoas diariamente, que conta com uma companhia da Polícia Militar e 14 câmeras de vigilância, que, segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP/DF), estão em funcionamento. Os equipamentos gravaram suspeitos abordando os três jovens pouco antes do crime e a fuga deles. O momento da facada não teria sido registrado porque o local ficaria em um ponto cego, fora do alcance das câmeras. Até o fechamento desta edição, quase 20 horas após a morte do rapaz, ninguém havia sido preso.
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A vítima
Milton Junio Rodrigues de Souza » Estudante de ciência política da UnB » Morava no Gama com um irmão, enquanto o restante da família reside na Bahia » Era militante da causa LGBT+ » Morreu aos 19 anos, com uma facada no peito, na Rodoviária do Plano Piloto
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Além de um adulto, outro homem que vive em situação de rua, identificado como Galego, é suspeito de participar do crime. Eles abordaram a vítima e os dois amigos, Ary Martins, 21 anos, e Ícaro Carlos de Sousa, 19, no ponto de embarque do coletivo que os levaria para casa. Segundo os sobreviventes, um dos desconhecidos apareceu repentinamente e pegou o isqueiro que estava com Ícaro. Ao verem que ele estava com um alicate na mão, os rapazes se afastaram. No entanto, Galego teria seguido o trio e o outro morador de rua apareceu com uma faca.
Ary foi atrás de ajuda na unidade da PM da Rodoviária, enquanto Milton e Ícaro seguiram em direção ao banheiro, sob uma das escadas rolantes. Mas, antes de entrarem no cômodo, um dos suspeitos deu uma facada em Milton. “O cara nos seguiu e foi para cima do (Milton) Junio, que ainda tentou se defender colocando a mochila na frente (leia Depoimento)”, contou Ícaro. Com o rapaz no chão, os agressores levaram a carteira e o celular. PMs acionaram bombeiros para atender a vítima. Os socorristas chegaram em 20 minutos. Tentaram reanimar o jovem por 40 minutos, sem sucesso.
Família
Milton Junio morava no Gama com um irmão, enquanto o restante da família reside na Bahia. Até as 22h de ontem, o corpo do jovem estava no Instituto de Medicina Legal (IML). Nenhum familiar havia comparecido ao prédio para iniciar os trâmites de liberação. A previsão era de que a mãe da vítima chegasse na madrugada.
Investigadores da 5ª Delegacia de Polícia (Área Central) tratam o caso como latrocínio (roubo com morte). Eles tiveram acesso às imagens do circuito de segurança. O momento do crime não foi capturado pelas câmeras de segurança, mas os suspeitos aparecem discutindo com as vítimas e fugindo após matarem Milton.
Responsável pela apuração do caso, o delegado Glayson Gomes disse que qualquer manifestação sobre o andamento da investigação seria repassada por meio da Divisão de Comunicação (Divicom) da Polícia Civil. Até o fechamento desta reportagem, a unidade informou que não havia nenhuma novidade e que os suspeitos ainda não haviam sido presos.
Comoção
O Centro Acadêmico de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) se manifestou sobre a morte do aluno por meio de nota oficial. “O momento é de relembrar as boas histórias que Junio deixou conosco e os momentos que nos fazem lembrar a pessoa extraordinária que era, alto astral, sorriso no rosto e querido por quem o conhecia. Em nome de todos os alunos de ciência política, lamentamos profundamente essa perda e desejamos mais sinceros sentimentos aos amigos, familiares e a todos que de alguma forma sentirão sua falta”, diz o comunicado.
Militante da causa LGBT, Milton costumava frequentar eventos relacionados à temática. Emocionado, o amigo Walysson Ribeiro, 19 anos, relembrou com carinho de Milton e disse que o conheceu em um bloco de carnaval. “Ele sempre estava fazendo alguma piadinha, amava dançar e ir pra festas. Se importava com todo mundo. Ele era uma pessoa que queria crescer profissionalmente para ajudar a família, queria ser uma pessoa que marcasse a vida de todo mundo. E marcou”.
Abalados com a morte do universitário, amigos e desconhecidos começaram a se manifestar por meio das redes sociais, poucas horas após o crime. “Você sempre estará em nossos corações e será lembrado por ser a pessoa mais carismática, sorridente e alegre. Descansa em paz, príncipe. Não iremos esquecer tão cedo da sua grandeza”, escreveu uma amiga na página de Milton no Facebook. “É muito injusto tirar a vida de um rapaz de 19 anos, que mal conheceu a vida e que lhe foi arrancada a oportunidade de viver”, lamentou outra colega.
A cantora pop Pabllo Vittar também prestou homenagem ao universitário. Por meio dos stories do Instagram, a artista publicou uma foto de Milton Junio com uma mensagem de pesar. “Um dos vittarlovers mais fofos foi morar no céu”, escreveu. Vittalovers é a forma como são chamados os fãs de Pabllo Vittar.
Mais de 400 mortes
De janeiro a novembro de 2018, houve 403 homicídios e 23 latrocínios em todo o Distrito Federal. Uma média de 36 assassinatos mensais e dois casos de roubo com morte a cada mês. No mesmo período de 2017, forças de segurança pública contabilizaram 448 mortes violentas e 34 latrocínios. A Secretaria de Segurança Pública não divulgou números da violência apenas na área central de Brasília ou em todo o Plano Piloto.
Depoimento
Ícaro Carmo, amigo da vítima
“A gente estava voltando de uma festa. Estávamos sentados na escada da Rodoviária, quando chegou um mendigo e tomou o isqueiro da gente. Só que ficamos de boa, não íamos discutir. Aí, ele começou a mexer com a gente, nos afastamos e ele continuou. Então, chegou um amigo dele perguntando se estávamos incomodando, e o cara disse que sim. Saímos de perto. Eu fui com o (Milton) Junio ao banheiro e outro amigo ficou perto das mulheres que trabalham lá, porque disse que se sentia mais seguro. Depois, o cara nos seguiu com uma faca e golpeou o Junio. Eles fugiram, o Milton foi andando pra trás, até que caiu no chão, nos meus braços.”