Assaltante raivoso: nada levou
Nesta crônica desejo alertar os leitores para detalhes de como proceder evitando assaltos em suas residências. Ou seja, as articulações que os agentes do mal organizam para invadir seus lares aproveitando-se de simples “conversas sociais”, aquelas que nos parecem inocentes e inofensivas.
Passados 35 anos da ocorrência, ainda guardo na memória, os detalhes que agora transmito ao público. Estabeleci amizade com uma cidadã e deixei-me levar por algumas trocas de confissões. Dias depois, a amigos íntimos ela deixou escapar que estava “se ajeitando” com um velhote descasado, que vivia sozinho numa enorme casa, de muros altos, e guardava dólares, para um futuro giro pelo exterior.
Notícia de dólar para quem é chegado às facilidades de obtenção de dinheiro, corre depressa. No círculo social estava uma criatura que viu no fato uma oportunidade de alinhavar um assalto.
Herlando, de posse dessas informações da namorada, aluga uma Kombi com motorista e contrata um capanga. Dias antes eu havia torcido o tornozelo e estava com uma “bota de gesso”, andando com dificuldade. Toca o telefone. A “Servidora” de minha casa atende:
– Casa de Seu Carlos Santos? Aqui é uma equipe dos Correios e temos uma encomenda para ele remetida por D. Maíra Pimentel, do Rio de Janeiro. Queremos confirmar o endereço. Chegaremos já.
Maíra, era u’a ex-Miss Náutico e Miss Pernambuco, minha amiga de infância, sobre quem costumava divulgar ações. Toca o interfone e a “Servidora” atende. Era o homem dos Correios, para entregar a encomenda. Como eu já estava no terraço, autorizei a abertura da chave elétrica do portão de ferro e fui, mesmo mancando, receber o pacote.
Um jovem alto, de casaca de couro, sapatos de verniz e calças jeans. Mas nada de fardamento do Correio. Estranhei. Mas logo ao me identificar levei um empurrão. Cai de costas com todo o corpo. Uma covardia para quem tinha cabelos brancos e estava com uma “bota de gesso” na perna.
– O que é isto, rapaz, você está doido?! Estou engessado!…
– Entre, estou apressado; é um assalto. Quero seus dólares e as joias da família!
E sacou um “assombroso” Taurus, 38, cano longo. O outro cabra, foi entrando ligeiro e nervoso. Ao chegar à sala se deparou com a “Servidora” e sacou uma faca. Empurrou-a para os quartos da casa, onde foi desarrumando os guarda-roupas e levantando os colchões.
O “galã”, ameaçando-me com o “ferro”, ordenou-me deitar no chão da sala. Depois meteu o cano num dos meus ouvidos. Fiquei inerte, totalmente vencido. Logo depois, ele começou a levantar os quadros da sala, com a ponta do revólver, procurando um cofre oculto na parede. Coisa de filme.
Por sorte, eu havia instalado na antiga suíte de casal meu “home-office”. E notaria depois – felizmente – que ninguém acionou uma só gaveta da escrivaninha, onde eu guardara um pacote com alguns dólares, que seriam para comprar “Travelers Cheques”, logo que pudesse andar normalmente.
Já meio nervoso o bandido-chefe recebeu a confirmação de que nos quartos não tinha nada de joias. Só roupas. Aí veio o pior.
– Onde está o cofre com os dólares que o senhor tem?!… Vamos lá, senão eu lhe meto um caroço no intestino! Levante-se!
Com o “trabuco” pressionando minha mandíbula, fui empurrado até onde funcionara meu antigo escritório, lá nos fundos da casa.
Abri a porta, mostrei-lhe o cofre enterrado na parede, rolei o segredo e mostrei que nada havia. Ensacou o revólver e foi saindo. Acompanhei-o até o portão. Um rapaz de uns 30 anos, de boa postura, muito bem vestido. Na saída ainda dei-lhe conselhos. Estava visivelmente desolado pelo destrambelho.
Ao relatar esta ocorrência em detalhes deixo uma advertência aos meus leitores para que o fato sirva de exemplo. Nenhum tipo de conversa deve ser trocada com pessoas cujas relações forem recentes; notadamente se envolverem valores ou empodeiramento.
Mas a “novela” continuaria. O outro bandido conversara com a “Servidora”; pedira um copo d’água e trêmulo lhe informou que entrara naquele assalto porque devia dinheiro de compra de droga a Herlando. Completou informando quem me havia denunciado. Exatamente a amiga de u’a moça com quem saí algumas vezes e a prosa havia ocorrido num salão de beleza.
Na semana seguinte a “Servidora” atendeu outro telefonema lá em casa. Era o comparsa, dessa vez informando que Herlando fora preso.
Contou que namorada dele ensinava natação no Clube Internacional e de tanto fazer perguntas às senhoras banhistas sobre os trabalhos de seus maridos, despertou atenção da Segurança do clube, que por azar tinha um Diretor que era aposentado da PM e a “investigadora” foi “enquadrada”.
Com base nesses informes, Herlando que era também traficante de entorpecentes, foi “chaveado” pela Federal, seu belo e reluzente Taurus, recolhido; ganhou viagem pra São Paulo com direito a usar um par de algemas até o xadrez.
Enquanto isso eu estou aqui contando a história verídica de um verdadeiro assaltante destrambelhado. Foi acreditar em conversa fiada de mulher fofoqueira e se ombreou com um comparsa que era bem parecido com o “Doidinho”, companheiro Buck Jones, nos saudosos filmes de cowboy.
De nada adiantaram os muros altos, chaves elétricas, porque a inteligência dos amigos do alheio pode se basear em informações apuradas num salão de beleza, para traçar um plano, no caso, infrutífero.
Nunca esqueci o tamanho do cano do revólver que forçou minha mandíbula a tal ponto que ainda hoje me incomoda.