Foto 1 – As margaridas de Abéché
Maurice Du Paul e Morgannyia Abrillé formavam um casal nascido em Abéché, pequena província do Chade, uma das mais importantes cidades dominadas pela França no século passado.
Depois de viver num verdadeiro inferno de contínuas guerras civis por conta da instabilidade político-administrativa, Maurice e Morgannyia conseguiram fugir pela fronteira de Abéché com o deserto Saara. Na diminuta bagagem, a roupa do corpo, uma pequena quantidade de dinheiro sem valor algum noutras cidades e países; uma sacola de pano com alguns víveres; sementes de várias flores e duas filhas.
“Abéché é a quarta maior cidade do Chade e é a capital da região de Quaddai. Abéché tornou-se capital do Sultanato de Wadai na década de 1890, depois que os poços de Ouara , a antiga capital, secaram.
Em 1909, as tropas francesas invadiram o Reino e estabeleceram uma guarnição em Abéché. A França assumiu o poder, forçando o sultão a renunciar ao trono. Naquela época, Abéché era a maior cidade do Chade com 28.000 habitantes, mas grandes epidemias reduziram a população para 6.000 em 1919. Em 1935, o sultanato foi restaurado por ordens do governo francês, e Muhammed Ouarada, herdeiro do trono após seu pai tornou-se rei. Uma vez que um dos redutos da rota do comércio de escravos árabe, a cidade é conhecida hoje por seus mercados , mesquitas , igrejas, praça (a Place de l’Indépendance) e para o palácio do seu sultão.
Abéché tem várias escolas, um hospital, uma universidade e é uma das principais guarnições da Armee Nationale du Tchad ANT. Há um pequeno aeroporto ( IATA : AEH , ICAO : FTTC ), ID do aeroporto: AE, operado do nascer ao pôr do sol (SR-SS) com voos para N’Djaména .
Em 25 de novembro de 2006, a cidade foi tomada pela União das Forças pela Democracia , um grupo rebelde que busca depor o presidente Idriss Déby . Vários saques ocorreram durante a noite. No mesmo dia, a vizinha Biltine foi capturada pelo Rally das Forças Democráticas, outro grupo rebelde. Um dia depois, ambas as cidades foram retomadas pelo exército chadiano.
Em 30 de outubro de 2007, a cidade chamou a atenção internacional quando 17 voluntários franceses que trabalhavam para a instituição de caridade Zoé’s Ark foram presos por suposto sequestro de crianças .
Abeche é o centro para a entrega de assistência humanitária para aprox. 240.000 refugiados de Darfur que vivem em 12 campos a leste da cidade, perto da fronteira com o Sudão. Várias organizações abriram escritórios em 2003 e 2004, por exemplo, o ACNUR, a Cruz Vermelha, a GTZ alemã e a UNICEF.” (Informações pesquisadas no Wikipédia)
A fuga e a chegada ao Brasil
Além do que está citado no primeiro parágrafo deste texto, com informações pesquisadas, o que se sabe de Maurice Du Paul e Morgannyia Abrillé, é que viveram quase uma dezena de anos “fugindo” à procura de um mundo novo, onde pudessem viver em paz – a preocupação maior, além do desejo de viver, era com as duas filhas, por conta do insistente e permitido tráfico de crianças.
Como e quando chegaram ao Brasil, quase ninguém sabia. Mas, todos sabiam que, o amor que tinham pelas filhas era imenso e os fazia enfrentar com risco de morte qualquer adversidade. As filhas, eram, enfim, a maior prova material da existência do amor entre eles, os fugitivos de Abéché.
A vida de fuga os trouxe ao Brasil. Aqui encontrariam várias dificuldades, haja vista que as poucas moedas que carregaram quando fugiram de Abéché sequer eram conhecidas neste país continental. Precisavam vestir, comer e morar.
Também nunca se soube como a família chegou ao Ceará, mais precisamente no povoado Timbaúba, hoje parte de Pacatuba, e já incluída na RMF (Região Metropolitana de Fortaleza).
As quatro pessoas negras, zanzando pelas ruas de um povoado pequeno, e de população também pequena, onde todos se conhecem, chamaram a atenção de alguns, especialmente das autoridades da gestão municipal. Eis que surgiu então o primeiro problema muito sério: a comunicação. Os quatro não entendiam nada do que ouviam e não conseguiam se fazer entender.
Mas, Deus existe, e está em tudo que é lugar. Alguém teve a ideia de tentar uma solução para o problema, usando a cor da pele dos quatro. Foram levados para o Quilombo dos Pretos. Ali ficaram um dia, ficaram dois dias e ficaram uma semana. Não lhes faltaram alimento e uma imensa necessidade de entendimento – o que certamente os levaria a conseguir algum trabalho para a sobrevivência.
Foto 2 – Margarida branca
Finalmente, o problema ganhou uma provável solução, e tudo parecia estar em casa, como era em Abéché.
Mas, a dificuldade de comunicação continuava. Maurice Du Paul passou a ser “Maurício”; Morgannyia, ficou mais acessível, sendo conhecida como “Morgana”. As filhas, com nomes originais impronunciáveis pelos quilombolas, passaram a ser tratadas como Margaridas.
A mudança e a adaptação de “Maurício” e família continuava. Agora, com celeridade, pois o tempo não volta, depois que passa.
A simpatia, o bom trato com os novos amigos e a disponibilidade para o trabalho, mereceram o respeito dos que ali já viviam há muitos anos.
Maurício ganhou um bom “pedaço de terra” para trabalhar, e, assim, alimentar a família com dignidade. Ganhou, também, alguns equipamentos para trabalhar a Terra. E foi à luta!
Eis que começou a esquecer Abéché e até as dificuldades que enfrentara para estar ali naquele momento. Vivo, e ao lado da família. Mas, vivendo momentos de alegria, lembrou que, em algum lugar guardara algumas sementes que trouxera de Abéché, na fuga com Morgana e, agora, as Margaridas.
Foto 3 – Margarida vermelha
Encontrou as sementes, e entendeu que chegara a hora do plantio. Preparou a terra e, para isso, até que teve ajuda de alguns novos amigos que, naquele quilombo, nunca ninguém vivia só.
Maurício plantou todas as sementes. Misturadas. Alguns dias depois de plantadas as sementes, nasciam os brotos. A mão de Deus funcionou e Maurício foi usado para separar brotos de brotos, como se os conhecesse desde muito tempo.
Chuva. Mais chuva. Os brotos cresciam e tomavam forma de roseiras. Cresciam e cresciam, até que alcançaram o tamanho ideal para a floração na primavera que se aproximava.
Foto 4 – Margaridas amarelas
A brisa noturna levou Maurício e a família – Morgana e as Margaridas – ao recolhimento para o descanso de mais um dia de intenso trabalho na plantação.
Distante dali, com os primeiros raios de luz, o cantar de um galo que não possuía, acabou por despertar a família – Só então Maurício percebeu que, ao redor de si, em vez de apenas duas, havia várias margaridas.
Margaridas amarelas, brancas, roxas e até vermelhas. A colheita foi farta e o resultado da fuga, do sofrimento enfrentado ao lado de Morgana e das Margaridas, estava sendo recompensando.
Reflexão: o que seria de Maurice Du Paul e Morgannyia Abrillé, se não fossem as margaridas. As que carregaram consigo na fuga, para evitar o rapto e o sequestro, e as que lhes mostraram na chegada da primeira primavera, uma luz para uma nova vida?