1
Começa assim a história
Do folheto feminino:
A mulher com sua manha,
Território o nordestino,
Com patriarcado vil,
Montou-se então um ardil,
Pra traçar nosso destino.
2
Lá pra mil e novecentos,
E trinta e oito asseguro,
Foi que a mulher editou,
E plantou para o futuro,
O folheto feminino,
Com o nome masculino,
Que hoje aqui emolduro.
3
Quando a mulher resolveu
Escrever o seu cordel,
Ainda meio acanhada...
Não quis botar no papel,
Seu santo nome de pia,
Porém foi uma Maria,
A primeira do painel.
4
Era Altino Alagoano
Que assinava a autoria.
A do primeiro folheto,
Que a mulher se atrevia
A escrever sem assinar
Para o marido alcunhar
Com nome de Fantasia.
5
E foi Maria das Neves,
A Batista Pimentel!
Que teve o afoitamento,
De publicar um cordel,
E mesmo não assumindo
O que estava produzindo
Na lavra do seu vergel.
6
Era Francisco das Chagas,
De sobre nome Batista,
Pai de Maria das Neves,
A primeira cordelista.
Ele foi um pioneiro,
Do folheto brasileiro,
Na arte especialista.
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“O Violino do Diabo.
Ou o Preço da Honestidade”,
Foi o primeiro folheto,
Tornou-se até raridade,
Pela mulher concebido,
Como troféu exibido,
Prova viva da verdade.
8
Os folhetos que Das Neves,
Naquele tempo editava.
“Corcunda de Notre Dame”
Na sua lista constava,
E outros títulos mais,
Em obras universais,
Ela se fundamentava.
9
“O Amor Nunca Morre” é,
Também sua criação,
Mais um cordel que Maria,
Acresceu a coleção.
Sua rica trajetória
É um marco na história
Nobre contribuição.
10
Maria chega ao cordel,
E com personalidade.
Letrada, bem preparada,
Replena de habilidade.
Disfarçada ocupa espaço,
Dando seu primeiro passo,
Rumo à nova atividade.
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E a ascensão do cordel,
Das Neves acompanhou.
A Popular Editora,
Foi o seu pai quem criou,
Instalada em João Pessoa,
Aquela ideia tão boa,
Maria testemunhou.
12
Para falar a verdade,
Testemunhou muito mais...
Só o homem editava!
Das mulheres, nem sinais.
Pode parecer incrível,
A mulher era invisível,
Continham seus ideais.
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Só depois de muito tempo
A mulher entra em ação.
Tira o verso da gaveta
Mostra a sua produção.
Assumindo o seu lugar,
Na cultura popular,
Cumprindo sua missão.
14
Isso só aconteceu,
Entre sessenta e setenta,
A mulher com liberdade,
Depressa se reinventa.
Ela muda de postura,
Garante a assinatura,
No cordel que apresenta.
15
Chega de só propagar,
Saberes e tradição.
Chega de contar histórias,
Fazer adivinhação.
Com tanto conhecimento,
Afinal chega o momento,
De mudar de posição.
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Já cansada de engolir,
O que tinha na garganta,
Cansada de ser a musa,
Às vezes puta ou santa,
Cansada de ser podada,
Encara nova jornada,
Assume seu verso e canta.
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Uma luz no fim do túnel,
A mulher chega avistar.
Mas a estrada a seguir,
Ela tem que desbravar.
Porque é pura ilusão,
Sua ampla aceitação,
Não vamos nos enganar.
18
No mundo cordeliano,
Inda mora o preconceito.
Na produção feminina,
Muita gente põe defeito,
E perde a oportunidade,
De conhecer na verdade,
Cordéis com outro Conceito.
19
Do jeito que tem mulher
Escrevendo sem cuidado,
Tem homem que faz cordel
Sem entender do riscado,
Não venham com zombaria,
O dom da sabedoria,
Floresceu assexuado.
20
O mercado é escasso
Para a mulher cordelista.
Com o corporativismo
Nós somos poucas na lista.
Nos bancos de academia
Inda somos minoria,
Mas nos postamos na pista.
21
Corre o cordel feminino
Sem nenhuma timidez.
A mulher fortalecida,
Não espera, faz a vez.
Sabe que é competente,
Se a lacuna é existente
Preenche com vividez.
22
Aborda qualquer temática
Verseja com qualidade.
Se for para glosar, glosa!
Com muita propriedade.
Faz peleja virtual,
O seu mote é atual,
Essa é a realidade.
23
A cordelista zelosa
Que cumprem sua missão,
Sabe que o bom cordel
Em sua composição,
Boa rima deve ter,
A métrica é pra valer,
Ao compor sua oração.
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Somos muitas escrevendo
Algumas com maestria.
Nosso cordel feminino,
É canto que contagia.
Abram alas pras guerreiras,
Somos poetas herdeiras,
As herdeiras de Maria!
*
Fim