AS FOLHAS
(Humberto de Campos)
Lançados para longe da pátria pelos movimentos revolucionários que estalaram depois da guerra, o conde Ricardo e o príncipe Romualdo conversavam, displicentes, naquele começo de verão oriental, à sombra do grande plátano do parque do hotel, trocando ideias e fazendo comentários discretos sobre a situação política dos países em que haviam reinado. Estirados nas suas cadeiras de viagem, mostravam, ambos, um profundo desinteresse pelas coisas vulgares do mundo. E era por isso que, de vez em quando, mergulhavam em silêncio profundo, quedando a acompanhar com os olhos, melancólicos e soturnos, as oscilações da fumaça clara que atiravam, preguiçosos, para o ar.
O dia estava morno, quieto, parado, anunciando para a noite uma nova tempestade do Deserto. E era nisso que pensavam os dois fidalgos ilustres, despojos elegantes de dois tronos desmoronados, quando o príncipe começou a seguir com os olhos, uma a uma, as folhas amarelas que se desprendiam da árvore, e que se vinham espalhar no chão, estendendo pelo solo um crespo tapete de topázio. De repente, lançando para o espaço uma nuvem de fumaça cheirosa, o príncipe observou, alisando a barba negra e cerrada:
— Como os homens se assemelham às árvores!...
O conde Ricardo fechou o livro que principiara a ler, e, erguendo para a fronde os seus olhos muito azuis e muito doces, esperou a explicação do companheiro.
E o príncipe continuou:
— Enquanto a árvore está verde, e tem seiva, nenhuma folha o abandona, senão arrancada à força. Venha, porém, o verão, e, com ele, a falta de seiva, a decadência da planta, e nenhuma quer ficar mais presa ao ramo!
Compreendendo o símbolo, o conde acentuou, sacudindo, triste, a cabeça leonina:
— São como os amigos...
E o príncipe confirmou:
— São como os amigos...
No silêncio do dia, as folhas, uma a uma, continuavam a cair...