AS DUAS PANELAS
Monteiro Lobato
Duas panelas, uma de ferro, orgulhosa, outra de barro, humilde, moravam na mesma cozinha; e como estivessem vazias, a bocejarem de vadiação, disse a graúda:
– Bela tarde para um giro pela horta! A cozinheira não está e até que venha, teremos tempo de dizer adeus à alface e fazer uma visita aos repolhos. Queres ir?
– Com todo o prazer! – respondeu a panela de barro lisonjeadíssima de honrosa companhia.
– Dá-me o braço então, e vamo-nos depressa antes que “ela” venha.
Assim fizeram, e lá se foram as duas desajeitadonas gingando os corpos ventrudos, cheias de amabilidade para com as hortaliças.
– Bom dia, dona Couve! Comendador Repolho, como passas! Coentrinho, adeus!
No melhor da festa, porém, a panela de ferro falseou o pé e esbarrou na amiga.
– Ai que me trincas! exclamou esta.
– Não foi nada, não foi nada…
Uns passos a mais e novo choque.
– Ai que desbeiças, amiga!
– Em casa arruma-se, não é nada…
Minutos depois terceiro esbarrão, esse formidável.
– Ai! Ai! Ai! Ai! Fizeste-me em pedaços, ingrata!
E a mísera panela de barro caiu por terra a gemer, reduzida a cacos.