Maria José Camargo Aragão nasceu em 10/2/1910, em Pindaré Mirim, MA. Médica, professora, jornalista e ativista política destacada na luta contra a ditadura brasileira, em 1964, e na defesa dos direitos da mulher. Sua história tem origem na extrema pobreza e foi uma referência na condição de líder do Partido Comunista no Maranhão.
Filha de Maria José Camargo Aragão e Emídio Aragão, descendentes de africanos. A mãe era analfabeta, porém obstinada na educação dos filhos. Com esta finalidade, a família mudou-se para São Luís, onde ela concluiu os primeiros estudos. Em seguida fez o curso “Normal” no Liceu Maranhense e formou-se professora. Mas alimentava o sonho de se tornar médica, o que parecia quase impossível diante de tantas dificuldades. Em princípios da década de 1930, sua mãe adoeceu e o médico indicou um tratamento mais apropriado, que só podia se realizar no Rio de Janeiro.
Em julho de 1934, a família mudou-se para o Rio com a mãe doente, vindo a falecer pouco depois. O sonho de se tornar médica foi retomado e no mesmo ano e ingressou na Universidade do Brasil, atual UFRJ. Com poucos recursos, passou por uns perrengues e, por pouco, não desistiu do curso. “Eu quis estudar Medicina, porque eu achava muito admirável um médico que era o amigo da gente, e a amizade ficou, porque ele foi nos visitar uma vez, algum de nós estava doente e ele não cobrou, porque viu nossa miséria, e eu achei aquilo muito bonito. Eu tinha sempre a vontade de ajudar, de que pudesse ser útil. A fome que nós passávamos era muito grande e eu achava que devia ter um jeito de se acabar com a fome, porque eu sabia que outras pessoas também passavam fome.” Revelou mais tarde num documentário.
Formou-se médica em 1942, iniciando como pediatra e foi trabalhar no Rio Grande do Sul, enfrentando o preconceito por ser mãe solteira. Sua vida sofreu uma guinada com a morte da filha, redirecionando sua carreira para a ginecologia. “Perder a filha pra mim foi uma das coisas mais dolorosas da vida, e eu pirei. Eu não conseguia trabalhar com criança, embora fosse pediatra e adorasse trabalhar com crianças, ainda hoje adoro crianças, e eu não conseguia trabalhar. Naquela época, eu entrava na sala do consultório, via aquelas crianças e saía pela porta dos fundos. Então, ia para rua andar, andar, andar… Eu ficava pensando: Isso não podia ser. Tinha perdido outra qualidade, que eu acho que é uma das minhas características, além de teimosa, de autossuficiência, é paixão pela vida, que eu conservo”.
Em 1944, impactada pela eloquência de Luiz Carlos Prestes num comício histórico, encontrou no Partido Comunista (PCB) um caminho para canalizar sua indignação. Retornou ao Maranhão, em 1945, e mergulhou de cabeça na organização e fortalecimento do partido em São Luís, enfrentando perseguições e difamações. Na época, o PCB chegou a ter mais de 2 mil militantes. Nas cidades do interior, a médica era tratada como prostituta ou besta-fera por alguns padres que incitavam a população contra ela. Mandavam tocar o sino a dobre de finados, símbolo da morte de alguém, quando ela chegava. Na cidade de Codó chegou a ser apedrejada.
Em 1962, viajou para a União Soviética, onde ficou um ano e três meses participando de cursos de formação política e visitou outros países do Leste europeu. De volta à São Luíz, passou a organizar o partido em bases mais sólidas Na década de 1960, sob o peso do regime militar instalado em 1964, enfrentou as oligarquias políticas e resistiu às perseguições e represálias impostas pela ditadura. Sua liderança no PCB, aliada à direção do jornal Tribuna do Povo, transformou-a num símbolo contra a repreensão. Manteve a atuação médica como bandeira de resistência, enfrentando humilhações ao atender pacientes em seu consultório sob a vigilância policial. Foi presa em diferentes momentos, inclusive sendo brutalmente torturada em 1973. Em 17 de maio foi interrogada pela Polícia Federal. “Esse interrogatório foi muito duro, foi muito duro, vendada, vendada, queriam saber quem era daqui quem era comunista, não sei, eu sei que lá tem oposicionista, comunista eu não sei, sabe.”
Em 1980, alinhou-se a Luiz Carlos Prestes na ruptura com o PCB e reafirmou seu compromisso com ideais libertários, juntando-se à Corrente Prestista. A partir de 1983, passou a integrar a direção da CUT-Central Única dos Trabalhadores do Maranhão, no cargo de Tesoureira. Em 1987 foi criada a Associação Brasileira de Mulheres Médicas-Seção do Maranhão, da qual foi a primeira presidente. Pouco depois foi reeleita na direção da CUT/MA e faleceu em 23/7/1991, aos 81 anos.
As homenagens, como a denominação da Praça Maria Aragão, no centro histórico foram previstas com ela ainda viva. Mas foram efetivadas com a criação do Instituto Maria Aragão, na Sociedade de Medicina e Cirurgia do Maranhão, em 19/10/2001, com a finalidade de preservar e servir de referencial para o estudo da vida social e política, favorecendo o resgate e a divulgação da história das lutas populares no Maranhão. Tais homenagens culminaram na inauguração do Memorial Maria Aragão, em 2004, projetado por Oscar Niemayer no Centro Histórico de São Luís. Como documento biográfico, temos o livro organizado por Euclides Moreira Neto: Maria por Maria – ou a saga da besta-fera nos porões do cárcere e da ditadura. Depoimento autobiográfico da médica militante comunista Maria José de Aragão, publicado pela EDUFMA, em 2017 e à disposição na Internet.