Júlia Valentim da Silveira Lopes de Almeida nasceu em 24/9/1862, no Rio de Janeiro. Escritora, dramaturga, jornalista, cronista, abolicionista e feminista, participou das primeiras reuniões para a fundação da ABL-Academia Brasileira de Letras, mas não pode integrá-la pelo fato de ser mulher, não obstante sua grande e importante produção literária, além de pioneira da literatura infantil. Filha do médico Valentim José da Silveira Lopes e de Adelina Pereira Lopes, teve papel destacado no jornalismo centrado nos temas: República, abolição dos escravos, emancipação da mulher e direitos civis.
Na infância mudou-se com a família para uma fazenda em Campinas (SP), onde viveu dos 7 aos 23 anos; foi incentivada pelo pai a escrever e teve suas primeiras crônicas publicadas na “Gazeta de Campinas”. Em 1884, passou a escrever regularmente, durante 30 anos, no jornal carioca “O Paíz” e em 1886 publicou, junto com a irmã, seu primeiro livro: Contos infantis, adotado nas escolas de todo o País por mais de 20 anos. No mesmo ano partiu para Lisboa e casou com o poeta e jornalista Francisco Filinto de Almeida. Incentivada pelo marido, publicou o livro de contos: Traços e iluminuras. Numa época em que era raro a mulher escritora, ela teve a sorte de receber incentivos do pai e do marido para exercer este ofício.
Retornou ao Brasil, em 1888, e lançou seu primeiro romance: Memórias de Marta, no ano seguinte. Vivendo em São Paulo, passa a colaborar regularmente com outros jornais e revistas: “Jornal do Commércio”, “A Semana”, “Ilustração Brasileira” e “Tribuna Liberal”. Na literatura, seu estilo é marcado por influências do realismo e naturalismo francês, notadamente pelos contos de Guy de Maupassant e romances de Émile Zola. Seu marido era diretor do jornal “A Província de São Paulo” e em seguida foi eleito deputado federal. Em 1891, publicou em folhetim na “Gazeta de Notícias”, o romance A família Medeiros, publicado em livro no ano seguinte. O romance teve a edição esgotada em 3 meses, e foi elogiado pela crítica Lúcia Miguel Pereira.
Em 1893 o casal passou a residir no Rio de Janeiro; constroem uma mansão em Santa Tereza, onde mantém o “Salão Verde”, frequentado por artistas e intelectuais; criam os (5) filhos e ela intensifica a atividade de cronista e escritora com diversos livros publicados, dentre os quais o romance A falência (1901), considerado sua obra mais relevante. Em 1896 participou de diversas reuniões com os intelectuais cariocas, com o objetivo de criar uma academia de letras. No ano seguinte foi criada a ABL-Academia Brasileira de Letras, cuja cadeira nº 3 deveria ser ocupada por ela. Porém, seguindo a tradição de não permitir mulher, foi ocupada pelo marido, que os cariocas passaram a chamar de “acadêmico consorte”.
Em 2017, num ciclo de palestras realizado pela ABL, foi reconhecida a injustiça cometida e ela foi incluída entre os autores que poderiam ter entrado na instituição. Em 1908 e 1912 recebeu os prêmios “Exposição Nacional” e da Companhia Dramática Nacional, com as peças A herança e Quem não perdoa, respectivamente. Em seguida realizou uma grande viagem, com toda a família, pela Europa e foi homenageada, em 1914, com um jantar no Mac-Mahon Hotel, ao qual compareceu a intelectualidade parisiense e muitos brasileiros. A viagem deveria continuar, mas a eclosão da II Guerra Mundial fez com que voltassem ao Brasil. A rotina de cronista prossegue junto com a publicação de livros, que chegou a mais de 40 títulos. Em 1922 foi convidada pelo Consejo Nacional de Mujeres de Argentina, em Buenos Aires para dar palestras e na volta, participou do I Congresso Feminino do Brasil, no Rio de Janeiro.
Em 1924, sua filha, Margarida, foi contemplada pela Escola de Belas Artes (RJ) com uma bolsa de estudos, obrigando-a a ficar 4 anos estudando em Paris. No ano seguinte, ela vende a mansão de Santa Teresa, aplica o dinheiro em ações e todos passam a viver em Paris junto com a filha. Na Europa, passou a conhecer melhor alguns países ao mesmo tempo em que escreve e publica alguns de seus livros em francês. Os filhos, já adultos, seguem suas vidas e o casal retorna ao Brasil em 1931. Sua filha Lucia, que vivia com o marido na África, adoeceu e levou-a a viajar até lá, em 1934, para trazê-la junto com os netos e genro, visando um tratamento melhor no Brasil. Por uma ironia do destino, ela preocupada com a saúde da filha, 8 dias após chegar da África, pegou uma febre amarela com complicações renais e linfáticas, e veio a falecer em 30/5/1934. Junto com a missa de 30 dias, foi publicado seu último romance “Pássaro tonto”
A partir da década de 1980, vem sendo demonstrado certo interesse pela sua produção literária, com análises e reedições de suas obras. Em 1987, a IMESP-Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, republicou seu livro A mensageira (1897), onde consta: “. Os povos mais fortes, mais práticos, mais ativos, e mais felizes são aqueles onde a mulher não figura como mero objeto de ornamento; em que são guiadas para as vicissitudes da vida com uma profissão que as ampare num dia de luta, e uma boa dose de noções e conhecimentos sólidos que lhe aperfeiçoem as qualidades morais. Uma mãe instruída, disciplinada, bem conhecedora dos seus deveres, marcará, funda, indestrutivelmente, no espírito do seu filho, o sentimento da ordem, do estudo e do trabalho, de que tanto carecemos.”.
Em 2016, a Biblioteca Nacional reuniu suas crônicas publicadas em “O Paiz” e publicou Dois dedos de prosa: o cotidiano de Júlia Lopes de Almeida. Em 2019 foi lançada a coletânea de contos de terror Medo imortal, incluído alguns contos de sua autoria. Tendo em vista sua condição de uma das pioneiras na defesa da emancipação das mulheres, bem que merecia alguma homenagem do Movimento Feminista.