Dona Maroca, a maior fofoqueira da “rua de baixo”, de tanto falar mal das filhas dos outros, pagou a língua, com o troco que lhe foi dado pelas suas duas filhas, Zefinha e Biloca, de 17 e 18 anos. Para ela, entre suas andanças e “paranças”, falando mal e reparando a vida dos outros, aquilo era uma afronta! Era o cúmulo dos cúmulos. Uma agressão incomensurável das duas filhas contra a santa e extremada mãe, que o que tinha de conservadora, tinha de linguaruda. A mulher anotava numa caderneta, as datas de casamento das filhas das amigas, para conferir se tinham casado grávidas.
Eis o crime das duas jovens: As duas filhas saíram para um “assustado” na casa de uma amiga, e só chegaram em casa às 7 horas da manhã, em um “baby” (antigo Buggy bugre baby), alegres e embriagadas. O dono do “baby” mal esperou que elas descessem do carro e arrancou em disparada, fazendo “cavalo de pau.”
Dona Maroca deu um escândalo com as filhas, chegando até a dar-lhes uns “safanões.” As duas protestaram, dizendo que o rapaz que tinha vindo deixá-las era um amigo da turma e que a festa tinha rolado até de manhã.
Indignada, Dona Maroca passou o dia resmungando e, vez por outra, insultava as filhas:
– Esse rapaz que veio deixar vocês é capado? Os outros que estavam na tal festa, também são capados???
Zefinha e Biloca, combinaram de deixar a mãe falar até se cansar. Passaram a dar calado por resposta.
Quando a onda baixou, as duas jovens se recolheram ao quarto, com sono e cansadas do “farrão” que tinham feito, na companhia dos amigos e amigas.
Horas depois, Dona Maroca flagrou uma das filhas, com voz doce ao telefone, dizendo:
– Pois é. A velha está intolerável! Mas a gente tapeia ela. Às 7 horas, estaremos lá.
Dona Maroca detestou ser chamada de “velha”. Bruscamente, tomou o telefone de Biloca. Em socorro à irmã, Zefinha apareceu e interrompeu a briga. Foi o começo da tormenta.
A “velha” vociferava, que o comportamento das duas era uma vergonha. Dizia que elas eram duas pestes e que preferia que tivessem nascido mortas.
– Maldita hora que o pai de vocês arribou com outra e deixou vocês comigo! -gritou.
Zefinha encarou a mãe:
– A senhora pensa que eu estou disposta a viver ouvindo desaforos? A Senhora precisa deixar de ser dominadora. Nós já somos adultas!
A mulher avançou para as duas filhas respondonas, enchendo-as de tapas e empurrões.
As duas jovens correram para a rua, enxotadas pela mãe:
– Fora, todas duas! – disse a mulher, sentindo-se desacatada.
Descontrolada, a mãe passou a proferir impropérios:
– Vão dar o que quiserem dar, mas, bem longe daqui! Não ponham mais os pés nesta casa!
As jovens deixaram a casa, que também era delas, sob a intensa fuzilaria da ira maternal, levando cada uma sua valise, com alguns apetrechos. Foram empurradas até a porta da rua, sob os olhares de vizinhos, que sem escrúpulos, a tudo assistiam “de camarote”. Tremiam e choravam, envergonhadas com a humilhação que a própria mãe lhes impusera. Na porta da rua, a mãe fez um verdadeiro comício contra filhos, dizendo que “filho é miséria! Filho é a peste bubônica!!!”
A vizinhança, ao final, se revoltou. Nenhuma mãe tem o direito de dizer essas coisas com os filhos. E essa mãe desnaturada expôs as duas filhas “às feras”, quando se sabe que até os animais defendem suas crias.
A mulher conseguiu destruir a autoestima das duas jovens, que, sem saber que rumo tomar, terminaram na casa de uma amiga, montadas numa máquina de costura, confeccionando roupas para fora, e ganhando dinheiro. Gastando o mínimo possível, e juntando dinheiro num cofrinho, com o tempo, conseguiram alugar uma casinha. Continuaram costurando e ganhando dinheiro para o próprio sustento. Tornaram-se conhecidas na cidade e superaram a mágoa que guardavam da mãe.
Perdoar é mais sublime do que doar. A doação, quase sempre, é material. Mas o perdão é a voz do coração, que chora de pena, da pessoa que teve a infelicidade de cometer um ato injusto, passando a amargar a dor do arrependimento e do remorso.
Quando a índole é boa, seja qual for a dificuldade enfrentada, a corrupção e a prostituição jamais encontrarão abrigo.
As duas filhas perdoaram a Mãe e nunca deixaram de ajudá-la, quando ela precisou.