24 de outubro de 2019 | 03h00
A aprovação definitiva da mais abrangente reforma da Previdência Social das últimas três décadas – com economia de cerca de R$ 800 bilhões em dez anos – é uma robusta demonstração de maturidade institucional do País. Medida naturalmente impopular, a reforma do sistema de aposentadorias passou a ser vista como incontornável ante o crescente desequilíbrio fiscal, que aproximava o Brasil perigosamente da insolvência. Os inimigos da reforma, notadamente as corporações de servidores públicos, foram isolados e se tornaram vozes minoritárias num debate em que se podia discutir o formato das mudanças, mas jamais recusá-las in limine – como se a Previdência não fosse deficitária e como se ainda fôssemos o país jovem de 50 anos atrás.
Essa percepção tem animado os investidores, como demonstram as sucessivas altas que a Bolsa de Valores registrou quando ficou claro que a reforma seria definitivamente aprovada nesta semana no Senado. O clima é de início de retomada, o que deverá ajudar a impulsionar outras medidas de ajuste que o governo diz estar preparando. Há algum otimismo, por exemplo, com o esperado impacto na atividade econômica em razão da injeção de mais R$ 12 bilhões com a antecipação do saque de R$ 500 do FGTS à disposição de trabalhadores que só poderiam tirar o dinheiro no ano que vem. Esse valor vem somar-se aos R$ 30 bilhões dos saques já previstos para este ano e aos R$ 2,5 bilhões liberados para os beneficiários do Bolsa Família a título de 13.º salário.
Mas tudo isso será apenas uma ligeira bonança antes de uma nova tempestade se não vier acompanhada de mais reformas profundas, em diversas áreas. O ajuste das contas públicas está bem encaminhado graças ao teto dos gastos, aprovado no governo de Michel Temer, e agora com a reforma da Previdência – sem a qual esse mesmo teto de gastos seria pulverizado. O próximo passo, segundo informa o governo, é conseguir a aprovação, até o final do ano, de uma proposta de corte de despesas obrigatórias, sobretudo as relacionadas aos servidores públicos. O objetivo é abrir espaço no Orçamento para aumentar os gastos com investimentos, absolutamente necessários para melhorar a infraestrutura do País.
O caminho é longo e tortuoso. A reforma tributária, por exemplo, deverá ficar somente para o ano que vem – e ainda não se sabe qual será a proposta do governo. Há também o desafio de realizar a reforma previdenciária nos Estados, cujo rombo está inviabilizando o funcionamento cotidiano da administração.
Tudo isso tendo como pano de fundo as crises políticas provocadas pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, e seus filhos. Se já não dispunha de uma base parlamentar firme para aprovar seus projetos sem sustos, o presidente implodiu o próprio partido, o PSL, tornando incerto o apoio até mesmo de seus correligionários.
Assim, o avanço das reformas continuará a depender da disposição e do poder de articulação dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre. Tem funcionado razoavelmente bem até aqui, mas, num regime presidencialista, é necessário que o presidente da República, respaldado por seus mais de 50 milhões de votos, norteie o debate na direção da plataforma vencedora da eleição. Felizmente, os reformistas têm prevalecido no Congresso, e para o bem do País é bom que continue assim.