|
|
Juiz Paulo Rogério Santos Giordano lê a sentença contra Adriana Villela: 32 anos de prisão pelo assassinato do pai, José Guilherme, e 32 pelo da mãe, Maria Villela
|
Após 10 anos, o Crime da 113 Sul, enfim, tem um desfecho. Adriana Villela, acusada de mandar matar os próprios pais, foi condenada a 67 anos e 6 meses de prisão em regime fechado pelo Tribunal do Júri de Brasília. Em 28 de agosto de 2009, o ex-ministro do TSE José Guilherme Villela; a advogada Maria Villela; e a empregada da família, Francisca Nascimento Silva, receberam, no total, 73 facadas dentro do apartamento do casal. Três homens estão presos e sentenciados pelo crime: Leonardo Campos Alves, Paulo Cardoso Santana e Francisco Mairlon Aguiar.
Apenas a filha dos Villela ainda não havia enfrentado o crivo da Justiça. Mas, por ter respondido ao processo em liberdade, ela terá a mesma prerrogativa para recorrer à segunda instância. Após 10 dias de julgamento, considerado o mais longo da história de Brasília, com 103 horas, os jurados decidiram pela condenação da arquiteta. A pena fixada pelo juiz Paulo Rogério Santos Giordano foi de 32 anos pelo assassinato de José Guilherme; 32 pelo de Maria Villela; e 23 pelo de Francisca; além de 3 anos e 6 meses pelo furto das joias da mãe.
Entendendo que a morte da empregada não aconteceu a mando da acusada, mas por decisão dos agressores a fim de assegurar a impunidade pelos demais homicídios, o magistrado dispensou a pena por esse crime. Na decisão, Paulo Rogério incluiu as qualificadoras de motivo torpe e uso de recurso que dificultou a defesa das vítimas, “já que foram colhidas de surpresa e de forma abrupta dentro do próprio lar”.
Após o término do julgamento, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, classificou o resultado como a maior injustiça em 40 anos de advocacia criminal. “Tenho absoluta convicção da inocência dela, mas acho que fizeram aqui uma monstruosidade”, declarou. Ele afirmou que recorrerá, se preciso, ao Supremo Tribunal Federal (STF), não para pedir redução de pena, mas a anulação do julgamento. “Essa condenação é um erro judiciário inacreditável. Respeito o Tribunal do Júri, e vou ao Tribunal de Justiça (do DF e dos Territórios) para reverter essa monstruosidade de uma condenação absolutamente sem provas.”
O procurador de Justiça do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) Maurício Miranda, no entanto, descarta a possibilidade de o júri ser cancelado. “Na matéria de prova, para anular, tem de ser um julgamento manifestamente contrário à prova dos autos”, explicou. Na prática, isso quer dizer que os advogados precisariam mostrar que houve inconstitucionalidade no julgamento. “Quando falamos de sustento, mostrando que tinha um arcabouço de provas, isso é mais do que suficiente para o Tribunal de Justiça não aceitar essa questão de julgamento manifestamente contrário.”
Na visão de Maurício Miranda, apenas uma questão muito fora da normalidade ou absurda poderia justificar a anulação, uma vez que a decisão do júri é soberana. Caso isso aconteça, Adriana passaria novamente pelo Tribunal do Júri de Brasília. A defesa pode pedir a redução da pena dada ontem. A decisão, no entanto, fica a cargo do Colegiado. O juiz avalia o pedido e pode tanto diminuir o tempo de condenação como aumentá-lo.
|
|
Após a condenação, a arquiteta não esboçou qualquer reação: abraço da filha, Carolina, e do irmão, Augusto
|
Impassível
Horas antes de saber que seria considerada culpada, Adriana estava confiante e, pela primeira vez, fez uma declaração à imprensa ao chegar ao TJDFT, às 9h. “Sou inocente e agradeço por trazer isso à luz agora aqui”, afirmou. Durante a sessão, ela prestou atenção ao que era dito, e, como de costume, bocejou algumas vezes e chorou durante as falas da defesa. Entretanto, na maior parte do tempo, manteve o semblante sério.
Conhecida pela espiritualidade, sentou-se no chão e meditou enquanto os jurados decidiam o futuro dela. Ao ser informada pela equipe de advogados sobre a sentença, não reagiu. Apenas abraçou a filha, Carolina Villela, e o irmão, Augusto Villela. Durante a conclusão dada pelo juiz, manteve a expressão impassível, sem qualquer gesto que denunciasse sentimentos. Discretamente, ela deixou o plenário pela porta dos fundos, sem falar com ninguém.
Nos 10 dias de julgamento, acusação e defesa exploraram a personalidade de Adriana. Durante o interrogatório, ela admitiu ter usado drogas na adolescência, como cocaína, maconha, ácido e chá de cogumelo, mas disse não ser dependente das substâncias. A sentenciada admitiu que, aos 14 anos, pensou em se jogar da janela do apartamento onde morava para afetar os pais. Ontem, os defensores revelaram que nessa idade ela foi “induzida a um aborto”.
Adriana admitiu que tem um “estopim curto”. Desde o começo do júri popular, isso foi utilizado pelo Ministério Público para indicar a suposta agressividade e frieza suficiente para mandar matar os pais. Os promotores também mostraram um laudo psicológico de Adriana, feito por especialistas da Polícia Civil e embasado em análises de interrogatórios dela. No documento, ela é chamada de desafiadora, autoritária e com traços compulsivos, vitimização e dramatização. “O vínculo de mãe e filha era tão somente material. Uma relação de ‘patrocinadores’ quanto aos seus projetos sociais. Existia um interesse financeiro e um distanciamento da afetividade”, informa o laudo lido ontem.
No dia do próprio interrogatório, a ré se mostrou sensível aos assassinatos dos pais, chorando ao relembrar o dia em que descobriu o triplo assassinato. “Vi em fotos da Corvida a imagem da minha mãe morta. Isso me atormentou durante muito tempo. Eu fechava os olhos para dormir e aquela cena vinha à minha cabeça”, contou. Também ficou com a voz embargada ao comentar a brutalidade. “Depois de ter enterrado meus pais, li uma manchete no Correio Braziliense, em um fundo preto, em que o jornal dobrado estampava: ‘72 facadas’. Enterrei meus pais sem saber que eles foram chacinados dentro de casa. Minhas pernas tremeram e quase caí na banca de jornal”, disse.
Protesto pós-sentença
Antes da sentença, o juiz titular da Vara do Tribunal do Júri de Brasília, Paulo Rogério Giordano, pediu para que o público deixasse para se manifestar do lado de fora do plenário. Quando a imprensa começou as entrevistas com representantes da defesa e da acusação em um corredor do órgão, apoiadores da condenada começaram a gritar: “Adriana é inocente”. A segurança do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) retirou o grupo do local. Aproximadamente 20 pessoas participavam do ato. Não foi necessário o uso de força por parte dos vigilantes.