Useira e vezeira em perguntas inconvenientes, Cesarina se destacava, na sociedade em que vivia, pela curiosidade e impertinência de suas perguntas. Isso fazia com que seu submisso marido, Astrogildo, distinto professor de Português, se arrolhasse de vergonha. As rodas sociais, que ela frequentava se dissolviam, rapidamente, em virtude de suas conversas, curiosas e intempestivas.
Como diz o ditado popular, "quem diz o que quer, ouve o que não quer". Por isso, uma vez por outra, Cesarina ouvia uma resposta incisiva e grosseira, de alguma amiga, também frequentadora dessas rodas femininas, organizadas para lanches, chás e bate-papos. Alguns maridos também gostavam de participar desses encontros.
Nesse duelo, entre a tagarelice e a ingenuidade, certa tarde, Cesarina perguntou, dirigindo-se ao esposo de uma amiga:
– Bonifácio, por que é que os homens tem o rosto pontuado de barba, com pelos irritantes e incômodos para a mulher, enquanto nós mulheres possuímos o rosto macio, liso e sem pelos?
O homem olhou para o marido de Cesarina, como quem pedia socorro, passando a mão na respeitável barba, e respondeu:
– Como a senhora sabe, Dona Cesarina, o homem foi feito de barro, e a mulher foi feita da sua costela.
Pois bem. Feito em primeiro lugar, com alguns punhados de barro úmido, o homem foi posto a secar ao sol, como se faz com todas as obras de cerâmica. A senhora deve saber que todo barro molhado, quando não leva sol, cria limo. E foi o que aconteceu com o homem, cujo rosto, na ocasião de ter o corpo exposto ao sol, ficou sombreado por um ramo de árvore, na oficina do Paraíso.
A mulher, não. Feita da costela de Adão, e posta para secar com o rosto para o sol, ficou com cabelo apenas na cabeça, posta à sombra, mas, em compensação, sem o limo na face, ou barba.
Cesarina descansou o queixo na mão esquerda, e ao fitar o próprio braço, exposto até a "avenida de ligação" com os seios, insistiu:
– E em toda a parte onde o sol não atingiu, o homem criou pelo?
Bonifácio estava pronto para dar uma resposta irreverente, mas, antes de abrir a boca, viu defronte dele, com a xícara suspensa e os olhos fuzilantes, o marido de Cezarina, que o interrompeu com voz trêmula:
– Bonifácio, tome seu chá, senão esfria!
E chegando perto da mulher, suplicou:
– Cesarina, por hoje basta!!!