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Segundo a investigação da Polícia Civil, a atuação da organização criminosa é marcada pela violência: assassinato em porta de fórum
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Quarenta e seis membros da maior facção criminosa do Distrito Federal foram presos ontem em operação da Polícia Civil. O alvo são líderes e integrantes do Comboio do Cão (CDC), organização investigada por, pelo menos, 24 assassinatos, além de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e outros delitos marcados pela violência. O grupo atua também no sistema carcerário do DF e estava envolvido em 420 ocorrências registradas em seis anos.
A operação, batizada de Rosário, em referência ao costume religioso usado para afastar demônios, é um trabalho conjunto da Coordenação de Repressão a Homicídios e de Proteção à Pessoa (CHPP), com as promotorias de Justiça do Riacho Fundo e do Recanto das Emas e o Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri). A investigação começou com base em série de homicídios com os quais a facção tinha envolvimento. Os assassinatos mantinham relação com disputas por território com outros grupos criminosos. A partir disso, a investigação seguiu com uso de medidas cautelares sigilosas de inteligência, autorizadas pela Justiça do DF, que permitiram coletar dados e provas sobre os crimes praticados.
A facção disputa o tráfico em quase todo o DF, pratica roubos de veículos e comércio ilegal de armas. Segundo a apuração da Polícia Civil, as ações eram marcadas por violência e pelo uso de forte armamento, como pistolas que permitem tiros de rajada. Diversos homicídios foram cometidos pelo CDC, em geral em decorrência de desentendimentos com outros criminosos. Além disso, a organização mantém conexões no exterior. O grupo rouba veículos, que são adulterados e levados para o Paraguai. Lá, são trocados por drogas — sobretudo maconha — que abastecem o DF e o Entorno.
Nos últimos anos, o CDC também se envolveu em crimes graves praticados na porta de fórum e cadeias da capital federal. Em 2016, um homem foi executado com 30 tiros em frente ao Fórum de Santa Maria. O tio da vítima foi morto, dias depois, com 50 disparos. Segundo a investigação, o grupo também tem ligação com a prática de rufianismo — quando se aproveita de prostituição alheia para obter lucros. Nesse ramo, a atuação ocorria em Taguatinga Sul. O local passou a ser utilizado no esquema de cobrança de taxas de garotas de programa e travestis. A facção teve envolvimento no assassinato de uma travesti na região em 2017.
Apesar das prisões de ontem, o principal líder do grupo criminoso fora dos presídios, William Peres Rodrigues, continua foragido. Ele é procurado pela Polícia Civil, que espera contar com denúncias para localizar o paradeiro dele. Conhecido como Wilinha, o criminoso tem histórico de uso de documentos falsos e mudanças de aparência.
Nos presídios
Mesmo preso desde 2017 por tráfico de drogas (leia Memória), um dos principais líderes da facção é Fabiano Sabino Pereira, o FB. Ele seria responsável por comandar as ações de dentro da prisão, com o auxílio de familiares e advogados. “Eles trabalham de maneira similar ao que fazem as maiores facções do país, como o PCC”, explica o delegado da CHPP Thiago Boeing. O CDC é a única organização criminosa nascida na capital federal, mas há registros de atuação do PCC e do Comando Vermelho no DF.
No presídio, o CDC ganhou força e controlava atividades de tráfico e de jogos de azar, de acordo com as investigações da Polícia Civil. O grupo tem um estatuto que regulamenta as práticas dos integrantes e estabelece julgamentos e punições a quem se opuser ao CDC ou aos membros. Existe a suspeita de que estejam envolvidos no esquema servidores públicos, como agentes penitenciários e policiais do DF e de Goiás. As investigações nesse sentido devem continuar.
Para sustentar as atividades, a facção se valia de uma complexa rede de lavagem de dinheiro. O esquema é alvo de um inquérito próprio e peça fundamental para desmantelar a organização criminosa, segundo a Polícia Civil. A Operação Rosário determinou o sequestro das contas bancárias de 60 pessoas, além da apreensão de 17 veículos e 11 imóveis.
As investigações mostraram atividades financeiras e padrões de vida de membros da facção incompatíveis com a renda formal deles. Para lavar o dinheiro, o grupo investia em compras de veículos e imóveis. Eles utilizaram uma rede de familiares e de pessoas próximas, usadas como laranjas para esconder a origem criminosa dos valores.
Os ganhos e a eficácia na lavagem de dinheiro permitiam à facção estrutura complexa e acesso a equipamentos de alta qualidade, como pistolas sofisticadas e drones. Segundo o delegado Thiago Boeing, a apuração focada na lavagem de dinheiro é fundamental para desestabilizar o CDC. “Eles conseguem ter todo esse domínio de dentro da cadeia porque há uma estrutura fora montada, sustentada com esses recursos financeiros”, detalha.
O delegado-chefe da Coordenação de Repressão a Homicídios e de Proteção à Pessoa, Fernando Cesar Costa, explica que a Operação Rosário faz parte de uma mudança de metodologia da CHPP. “Nós sabemos que grande parte dos homicídios que ocorrem no DF estão vinculados à atuação de grupos criminosos voltados, sobretudo, para o tráfico e para grandes roubos. Dentro dessa lógica, nós passamos a agrupar os inquéritos e analisá-los sob a ótica de atuação de um grupo organizado”, pontua.
As novas provas colhidas permitiram a reabertura de 14 inquéritos de homicídios e tentativas cuja autoria era desconhecida.
Memória
Violência
Em 2017, dois líderes da facção foram presos durante a Operação Líder da Matilha. À época, Fabiano Sabino Pereira, o FB, era réu em quatro processos, sendo três por porte ilegal de arma. Ele continua a chefiar a quadrilha. Além dele, foi preso Flávio Pereira da Silva, que respondia a 27 inquéritos policiais por crimes como furtos, roubos e tentativas de homicídio. Com eles, foram encontrados 155kg de maconha, uma pistola Glock 9mm com seletor de rajada, quatro carregadores e mais de R$ 3 mil em dinheiro. À época, a investigação destacava a forma violenta como a organização agia e a maneira fria como eliminava desafetos.
Balanço
46
Mandados de prisão
cumpridos na operação
420
Ocorrências relacionadas à facção
209
Inquéritos com envolvimento
de membros do grupo
60
Contas bancárias sequestradas por ligação com o CDC
50kg
Quantidade estimada
de maconha apreendida
3
Armas encontradas
com suspeitos na operação