Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Carlito Lima - Histórias do Velho Capita sábado, 10 de novembro de 2018

A VOLTA AO MUNDO EM 5.237 DIAS

 

 
A VOLTA AO MUNDO EM 5.237 DIAS

Anunciada tinha apenas 10 anos quando aconteceu o acidente de carro. Seu pai morreu e ela teve sérias fraturas, passou mais de dois meses no hospital, sobreviveu graças a uma promessa, segundo sua mãe, mulher controladora e mandona. Quando Anunciada completou 16 anos foi internada num convento, cumprindo a promessa de Dona Zélia. A jovem tornou-se frágil, temente a Deus e à mãe, aceitou resignada seu destino, ser freira. Estava em paz consigo, dois anos interna preparando-se para o noviciado, quando apareceu no convento o Padre Ramalho, ainda moço, beirando os 30 anos, alto, forte, alegre e bonito. Mexeu no coração e nas vísceras de Anunciada. A imagem do padre deu-lhe inquietude, desconcentração, insônia. A recíproca foi verdadeira, o padre encantou-se com a morenice, os olhos amendoados, os cabelos negros daquela noviça meiga. O Demônio atenta, e fez com que Anunciada ficasse como ajudante do padre durante as missas e preparativos. Com mais dois meses, os dois jovens estavam enfeitiçados. Aconteceu o previsto pelo Cão. Numa noite de lua nova, por trás da sacristia, o sangue escorreu pelas pernas de Anunciada. Continuaram encontrando-se, amando-se, até que um dia a madre superiora teve certeza que havia alguma coisa entre os dois, só pelos olhares e tomou uma decisão. Entregou a freirinha em sua casa afirmando falta de vocação, Deus perdoaria a promessa.

Anunciada ficou um mês e doze dias trancada em seu quarto, só saía para comer. Chorava a noite toda, a mãe pensava ser frustração em não ser freira, nunca imaginou que era saudade do Padre Ramalho. Noites insones se possuindo. Certa tarde Manuela, sua prima, foi visitá-la, conseguiu tirá-la daquele estado letárgico. Mostrou-lhe as noitadas de Maceió. A partir daquela data Anunciada dedicou-se à boemia e aos homens.

Em certo janeiro ensoralado um turista grego, passageiro do Maru Costa, convidou-a para conhecer o navio. Fizeram amor no camarote. Ao acordar-se no dia seguinte, o transatlântico atracava no Recife, havia viajado como clandestina. Daí aceitar o emprego de “massagista” no navio foi um pulo. No dia seguinte o Maru Costa partiu para Tenerife, sete dias de viagem pelo Oceano Atlântico. Não foi difícil arranjar clientes. Comprou roupas a bordo. À noite entrava nos salões encantando homens e mulheres. Na semana de viagem ganhou tanto dinheiro que não acreditou. Com apenas 19 aninhos tornou-se “massagista” de alto luxo. Teve uma conversa com o comandante, ficou no camarote como viajante permanente. Anunciada engrenou sua vida, enviava cartas e dinheiro para mãe orgulhosa com a filha, dizia ser comissária de bordo.

A divina brasileira, como a chamavam, ficou embarcada em camarote privado durante semanas, meses, anos. Percorrendo o mundo.

Anunciada exerceu a profissão de massagista durante 14 anos, 4 meses e 2 dias inquilina do Maru Costa. Apenas uma vez retornou à Maceió, de avião, para o enterro de sua mãe. No Parque das Flores todos queriam falar ou ver a menina Anunciada que um dia partiu sem destino, continuava solteira, charmosa, rica, misteriosa. A bela mulher abafou, vestido negro decotado, não passou mais dias na cidade porque o navio ia partir de Sydney na Austrália para Amsterdã na Holanda. O comandante telefonou pedindo sua presença, ela fazia parte do patrimônio no navio.

Assim Anunciada viajou por todo mundo, conheceu homens de toda espécie, escandinavos, latinos, asiáticos, africanos. O felizardo que passou uma noite com Anunciada na cama, jamais a esqueceu. Durante esses anos ela teve 875 propostas de casamento, todas recusadas, seu destino é a liberdade, dizia. O nome de Anunciada ainda corre nos quatro cantos do mundo como de fosse uma feiticeira do amor. Quando o navio atracava nos portos já havia fila de clientes para receber a brasileira nos hotéis da cidade. Seu nome tornou-se lenda na Europa, no mundo.

Até que o navio Maru Costa teve sérios problemas, antes de se aposentar, antes de o explodirem, fez seu último cruzeiro, por coincidência o mesmo roteiro em que Anunciada embarcou anos atrás. Deu uma tristeza na “massagista”, sentia-se parte do navio. Ela estava disposta a esconder-se e explodir-se junto com o navio. Quando o Maru Costa atracou em Maceió de passagem, o céu estava ensolarado, o mar era verde esmeralda com matizes azuis. O coração de Anunciada disparou, acabou a depressão, arrumou-se, pegou suas malas, desembarcou para sempre em sua terra.

Quem quiser conhecer nossa heroína, Maria Anunciada, é só visitar uma casa de massagem no bairro da Serraria. Ainda bela, aos 34 anos, ela atende com mais três jovens massagistas. Dizem que os clientes da casa preferem a coroa, por sua experiência e sabedoria. Os mais íntimos, ao ouvirem suas histórias, perguntam, “dos homens que teve a seus pés, qual o que mais amou”. Ela não hesita, afirma com segurança, sorrindo: “O primeiro amor ninguém esquece.


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