Eu sou um matuto broco
Sem instrução, sem leitura,
Criei-me arrancando toco
Com chibanca em terra dura,
Tirando ração pra o gado,
Cuidando do meu roçado
Pois aqui me sinto bem!
Vivo colhendo o que planto
Bem quietinho no meu canto
Sem dever nada a ninguém.
Levo a vida sossegada
Do nascer ao pôr-do-sol,
No final da madrugada
Contemplando o arrebol
E escutando a serenata
Que vem da orquestra nata
Do palco da natureza,
Agradeço orando a Deus
Por poder nos dias meus
Desfrutar dessa riqueza.
Eu vivo alegre demais
Morando no meu ranchinho,
No meio dos carrascais
Escutando os passarinhos
Cantando as modas nativas,
Olhando pras cores vivas
Do campo com seu matiz,
Aqui é o meu paraíso
Pois tem tudo que preciso
Pra que viva bem feliz.
Aqui não se justifica
Transtorno, aperreação,
Porque nessa terra rica
Não tem inquietação,
A tranquilidade é tanta
Que até quando o galo canta
Na madrugada serena
A gente sente prazer,
Dá gosto de se viver
Em felicidade plena.
Mas, mesmo nesse sossego,
Que a paz de Deus apresenta,
Logo o “demo” pega arrego
Nessa calma, e nos atenta!
Vem chegando sorrateiro
Parece um bom cavalheiro
Repleto de boa ação,
Porém, tudo é falsidade,
Pois a fingida bondade
Só são laços de traição.
E essa história inteirinha
Eu vou contar pra vocês!
Um dia, de manhãzinha,
Quase no final do mês,
Eu estava todo ancho
Bem pertinho do meu rancho
Na sombra de um juazeiro,
Quando chegou um “carrão”
E parou bem no oitão
No aceiro do terreiro.
Desceu um homem decente
Bem vestido, bem tratado,
Com aparência excelente
Dirigiu-se pra o meu lado,
E com muita educação
Apertou a minha mão
E disse assim: por favor,
Caso esteja disponível,
Eu queria se possível
Conversar com o senhor.
Eu lhe respondi: pois não,
Pode dizer o que quer!
Pois estou de prontidão
Pra lhe ajudar se puder,
Mas, fiquei “com um pé atrás”!
Pois vi naquele rapaz
Um “lobo em pele de ovelha”,
E por ser desconfiado
Fiquei alerta, antenado,
Com “a pulga atrás da orelha”.
Ele então olhou pra mim
Deu um suspiro profundo
E foi me dizendo assim:
Isso aqui é o fim do mundo!
Como consegue viver
Sem escola, sem lazer,
Sem nenhuma diversão?
No desprezo, no maltrato,
Igual a um bicho do mato,
Nessa intensa isolação?
Eu vim pra lhe auxiliar
A sair dessa “enxovia”,
E já passo a planejar
Uma ampla melhoria,
A começar pela casa
Cuja ideia se embasa
Numa construção moderna,
Também se inclui nesse plano
Um bom poço artesiano
A luz elétrica e a cisterna.
Um campo de futebol
Pra moçada jogar bola,
E penso em agir em prol
Pra que se erga uma escola,
E vou tomar providência
Para em regime de urgência
Ser construída uma estrada,
Incluso nessa atitude
Está um posto de saúde
Pra atender a matutada.
Para colocar em prática
Cada ideia em expansão,
E vou lhe explicar a tática
Por favor, preste atenção!
É que eu estou candidato
Pra ser prefeito, e de fato,
Se acaso eu eleito for,
Assumo esse compromisso
De construir tudo isso
Que prometi pra o senhor.
Meu nome é “José Pinheiro”,
Vou ser franco ao lhe avisar
Não penso em ganhar dinheiro
Pois meu lema é trabalhar!
E logo que passe o pleito
Se eu conseguir ser eleito
Já pode contar comigo
No avanço, no progresso!
É por isso que lhe peço
Vote em mim meu grande amigo!
O diabo pode não vir
Mas, envia um secretário,
Para enganar, iludir,
Fazer o povo de otário
Se esse matuto aloprado
Não fosse desenrolado
Ou mesmo astuto o bastante
Muito esperto e destemido
Decerto tinha caído
Na lábia do meliante.
Essa conversa ilusória
Não convenceu o campônio
Que viu em toda essa história
A tentação do demônio
E respondeu: candidato!
O senhor é o retrato
Fiel da deslealdade,
Eu posso está sendo crítico
Mas vejo em cada político
A cara da falsidade.
É bom pensar desde já
Pra que em cada eleição,
Não caia no “blá, blá, blá”,
De político fanfarrão,
Tem que ser bastante astuto
Assim como esse matuto
Que não caiu na cilada
De um candidato vilão
Cheio de “boa intenção”,
Mas, que não valia nada.