Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Correio Braziliense domingo, 20 de outubro de 2024

A RESSURREIÇÃO DA MEMÓRIA SINGU: INDÍGENAS GANHAM RÉPLICA DE GRUTA SAGRADA

A ressurreição da memória Xingu: indígenas ganham réplica de gruta sagrada

Pesquisadores reconstroem a gruta de Kamukuwaká, chamada livro de conhecimento do povo Wauja e de outras 15 nações. Em 2018, etnias descobriram que o local sagrado, excluído do território indígena, foi alvo de vandalismo em 2018

 

Cacique Akari Waurá ensina crianças sobre a própria cultura por meio das gravuras que estão na réplica da gruta -  (crédito:  Alaor Filho/Fotos Publicas)
Cacique Akari Waurá ensina crianças sobre a própria cultura por meio das gravuras que estão na réplica da gruta - (crédito: Alaor Filho/Fotos Publicas)

Aldeia Ulupuwene (MT) — A sensação é de reencontrar um familiar querido após muito tempo sem vê-lo. Assim pode ser descrita a emoção presente na aldeia Ulupuwene, no Mato Grosso, no último dia 3. O povo Wauja, que vive no Parque Indígena do Xingu, festejava com flautas, cânticos, adornos e vestimentas coloridas o retorno de uma figura sagrada ao seu território: a Gruta de Kamukuaká. Mas, desta vez, em forma de réplica.

Apesar do papel central na espiritualidade e cultura, a gruta ficou de fora da Terra Indígena do Xingu, primeiro território demarcado do Brasil, em 1961. A área foi comprada e, atualmente, é uma fazenda de soja.

A gruta do Kamukuaká foi tombada como patrimônio cultural em 2010 pelo Iphan, como forma de impedir que o local sagrado para os indígenas fosse modificado. No entanto, em 2018, o receio dos indígenas se concretizou. A gruta foi vandalizada e os símbolos de Kamukuaká arrancados da rocha.

A descoberta

"Quando cheguei lá, senti como se tivesse perdido alguém da família", relembrou emocionado o cacique Akari Waurá, de Topepeweke, uma das quatro aldeias onde o povo Wauja vive. Ele estava presente no dia em que os indígenas descobriram o ataque ao monumento cultural.

Akari contou que, quando criança, o pai o levava para a gruta para repassar ensinamentos sobre os costumes, conversar sobre liderança e também aprender o significado dos desenhos na pedra, em sua maioria de animais.

Com a gruta localizada em uma propriedade privada, Akari e seus familiares ficaram quase 20 anos sem visitar o local. Eles eram proibidos de entrar na terra pelos proprietários.

 

Onde fica xingu
Onde fica xingu(foto: Valdo Virgo)

 

Não se sabe ao certo quando a gruta foi vandalizada; o ato foi descoberto em setembro de 2018. A visita à gruta se deu por uma atividade de documentação dos indígenas com as equipes da Factum Foundation, ONG internacional — especializados em documentar artefatos culturais — e do People's Palace Project (PPP), centro de arte e pesquisa ligado à Universidade de Queen Mary, em Londres, na Inglaterra.

"Desde o início foi tratado como um ato de vandalismo, uma tentativa de apagamento de memória da comunidade, de tirar a sacralidade de um território que é um patrimônio cultural dos povos do Alto Xingu", defendeu Thiago Jesus, gerente de Projetos Indígenas e Climáticos da PPP, que presenciou a descoberta do vandalismo.

O ataque ao patrimônio está em segredo de justiça no Ministério Público de Mato Grosso. Até o momento, ninguém foi responsabilizado pelo ato.

Perda ancestral

A destruição da gruta do Kamukuaká gerou uma comoção enorme nas 16 etnias que vivem na Terra Indígena do Xingu. "Acredito que Kamukuaká é o pilar central de todos os acontecimentos da linha do tempo e do conhecimento Wauja", ressaltou a cacica Pere Waurá, da Aldeia Piyulewene. Ela relembra que, quando era criança, ia com os pais visitar a gruta em uma viagem que durava dez dias, parte feita em canoa e outra caminhando.

"Quando fizeram essa demarcação, a cabeceira do rio [Batovi, nascente do Xingu] ficou de fora e o patrimônio cultural também. O importante antes era preservar a terra, mas não pensaram direito no que ficava de fora e o que mantinham. Eles não sabiam que, para a nossa cultura, perder esse patrimônio é o começo da perda da nossa história", explica Mairawe, um dos caciques mais velhos da região.

Iniciativa internacional

Com a evidente perda cultural vivida pelos povos do Xingu, as duas organizações que tinham iniciado a documentação da gruta de Kamukuaká propuseram aos indígenas uma réplica da rocha. "A cultura é internacional, essa gruta pertence ao patrimônio mundial e também aos povos xinguanos. É uma luta do mundo e para mostrar que a gente pode, sim, fazer a diferença e proteger a cultura",diz Paul Heritage, presidente da PPP e cavaleiro da Ordem do Rio Branco, nomeado pelo governo brasileiro.

Os Waujas contam que, ao serem consultados sobre a ideia, não achavam que daria certo. Mas, mesmo assim, integraram todo o processo de reconstrução de memória da gruta. Isso porque havia poucos registros fotográficos da gruta original e somente algumas gravuras restantes nas rochas.

"Há uma diferença que marca todo este projeto. As pessoas sabem ler isto, sabem o que colocaram ali e podem transmitir o que colocaram. Em muitos outros projetos, isso é impossível porque a cultura foi perdida há milhares de anos. Os estudiosos podem ler os hieróglifos, mas não podem interpretar. Este aqui está vivo. As pessoas sabem o que têm, contam aos seus filhos e netos", reflete Juan Carlos Arias, líder da Factum para a instalação da gruta.

A construção da réplica demorou cerca de um ano para ficar pronta, entre 2018 e 2019. Mas ainda enfrentou muitos desafios no percurso de 8 mil quilômetros para chegar na aldeia Ulupuwene, escolhida pelas lideranças indígenas para abrigar o monumento sagrado, devido ao acesso e localização entre as quatro aldeias dos Waujas.

Pesando uma tonelada, com oito metros de altura e quatro de largura e profundidade, a obra ficou parada no ateliê espanhol por falta de verba para levá-la ao Brasil. Enquanto as organizações internacionais tentam arrecadar recursos, a pandemia do coronavírus paralisou todo processo por anos.

Enquanto isso, os indígenas realizaram mutirão na comunidade indígena para construir o Centro Cultural e de Monitoramento Territorial, o primeiro museu do Xingu, na aldeia Ulupuwene. Foram quatro meses fazendo os tijolos de barro, com a terra da sua própria "casa" para que os indígenas finalizassem o local que abrigaria a réplica. No final de setembro, seis anos depois de descobrirem a destruição da gruta original, a réplica chegou à aldeia.

Celebrar e reivindicar

O dia seguinte a um eclipse foi escolhido para a inauguração da gruta Kamukuaká, de volta ao território do Xingu. Indígenas de outras aldeias foram convidados a participar das mais de doze horas de celebração.

Desde a madrugada, os indígenas tocavam flautas. No amanhecer, iniciaram as pinturas corporais, com símbolos semelhantes aos da gruta, e os adornos coloridos utilizados nas celebrações. Danças embalaram o dia inteiro na aldeia, inclusive sob o sol escaldante do meio-dia. Juntos, eles caminharam até a casa onde está abrigada a réplica.

O presidente da Associação das Terras Indígenas do Xingu (Atix), Ianukula Kaiabi Suia, definiu a data como "marcante" e importante para a cultura brasileira. "O Brasil foi construído em cima de um território indígena e a sociedade brasileira precisa aprender a conviver com isso. O que a gente tem percebido, tanto de governo quanto sociedade, é a ignorância de saber e reconhecer o que a cultura indígena representa para a cultura brasileira", criticou.

Representando o Iphan, Fernando Medeiros, superintendente do instituto no MT, fez questão de conhecer o patrimônio depredado antes de ver a réplica para entender a semelhança. "Houve um dano do ponto de vista material, mas aquele lugar ainda tem uma potência extraordinária na imaterialidade em tudo que diz sobre a cultura indígena", comentou.

Fiscalização

Medeiros ainda acrescentou que, apesar da depredação, o tombamento foi muito importante na história da gruta para impedir projetos como a da construção de uma usina hidroelétrica ou rodovia no local. Sobre o ato de vandalismo, ele atribuiu a falta de controle de entrada e saída na fazenda, que era muito utilizada para pesca predatória, e ao sucateamento que a autarquia pública sofreu no último governo federal. Isso, segundo ele, afetou muito a fiscalização dos patrimônios culturais.

Juntos, Atix e Iphan formaram um Grupo de Trabalho (GT) para analisar o que será feito a respeito da gruta original. O acesso dos indígenas ao local está sendo negociado com os proprietários, bem como a possibilidade de tombar todas cabeceiras de afluentes do Rio Xingu. As ideias ainda estão em fase inicial de debate. Já para a réplica, o futuro previsto é de ensinar as crianças sobre a própria cultura, utilizando as gravuras que estão na réplica da gruta. Entre os desenhos, estão formatos de animais e alguns símbolos utilizados em artesanatos produzidos pelos povos do Xingu. Futuramente, o espaço também deve receber turistas, como forma de auxiliar na subsistência das populações indígenas.

Veja fotos da cerimônia

 

  • O povo Wauja, no Alto Xingu, realizou uma celebração especial, no início deste mês em comemoração ao líder espiritual Kamukuaká
    O povo Wauja, no Alto Xingu, realizou uma celebração especial, no início deste mês em comemoração ao líder espiritual KamukuakáAlaor Filho/Fotos Publicas
     
  • O motivo foi a chegada da réplica de Kamukuaká à aldeia Ulupuwene. O patrimônio foi depredado em 2018
    O motivo foi a chegada da réplica de Kamukuaká à aldeia Ulupuwene. O patrimônio foi depredado em 2018Alaor Filho/Fotos Publicas
     
  • Com flautas feitas de cano, os indígenas fizeram rito tradicional durante todo o dia
    Com flautas feitas de cano, os indígenas fizeram rito tradicional durante todo o diaAlaor Filho/Fotos Publicas 
     
     
  • Desde o amanhecer, danças eram realizadas na aldeia para marcar a cerimônia
    Desde o amanhecer, danças eram realizadas na aldeia para marcar a cerimôniaAlaor Filho/Fotos Publicas
     
     
  • As pinturas corporais continham desenhos que estavam na gruta
    As pinturas corporais continham desenhos que estavam na grutaAlaor Filho/Fotos Publicas
     
     
  • A cacica Pere Wuar
    A cacica Pere WuarAlaor Filho/Fotos Publicas
     
     
  • O cacique Elewoka Waur
    O cacique Elewoka WaurAlaor Filho/Fotos Publicas
     
  • O cacique Akari Waurá, de Topepeweke, relembrou infância aprendendo os primeiros passos da liderança com seu pai na gruta original
    O cacique Akari Waurá, de Topepeweke, relembrou infância aprendendo os primeiros passos da liderança com seu pai na gruta originalAlaor Filho / Fotos Publicas
     
     
  • Agora, as lideranças indígenas pretendem continuar ensinando a cultura do Alto Xingu através da réplica da gruta
    Agora, as lideranças indígenas pretendem continuar ensinando a cultura do Alto Xingu através da réplica da grutaAlaor Filho/Fotos Publicas
  • A gruta também terá função educacional para ensinar as crianças sobre sua ancestralidade
    A gruta também terá função educacional para ensinar as crianças sobre sua ancestralidadeAlaor Filho/Fotos Publicas 

 

*Jornalista viajou a convite da PPP

 


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