Os comentários eram agressivos entre as vizinhas, de janela para janela.
– Ontem à noite, fiquei de “plantão”, olhando pela rótula da janela, e vi tudo…Dizia a maldosa d. Maroca.
Outra respondia:
– A safada esperou que se fechassem todas as casas, abriu a porta, olhou de um lado para o outro, e como não havia ninguém, colocou um xale e saiu, só Deus sabe pra onde!!! Acho que ela vai se encontrar com algum sujeito muito rico. Não resta dúvida de que está prostituída, e já esqueceu o infeliz do falecido.
E o falatório era fogo cruzado:
– Guilhermina me contou que, outro dia, quando voltava de uma festa, tarde da noite, a encontrou saindo de casa. A degenerada cobriu o rosto com o chale, pra não ser reconhecida…
– Que mulher baixa, cínica e desavergonhada! – Isso era o mínimo que se dizia contra Madalena.
Propagado o escândalo pela redondeza, alguns moradores da rua em que morava Madalena, ficavam à espreita, horas e horas, aguardando, pelas frestas das janelas, o momento da sua saída.
Quando as rótulas se escancaravam, as cabeças apareciam e o falatório recomeçava, com a voz estridente de dona Marilu:
– Vocês viram a que hora essa “messalina” saiu de casa, ontem pela madrugada???
E a vizinhança respondia em coro uníssono:
– Somente um cego não vê uma coisa dessa! O defunto deve estar estrebuchando na cova, de raiva e vergonha…
E os comentários se espalhavam, cada vez mais:
– Quem diria! Era muito sonsa!!! Já devia chifrar o marido, há muito tempo! E o infeliz pensava que ela era uma santa!!!
Certa noite, alta madrugada, instigados pelas mulheres, alguns vizinhos acompanharam, à distância, os passos da notívaga, para desagravo do ultrajado morto.
Escondendo-se entre portais e árvores, olhando de canto a canto e pisando pé ante pé, os homens seguiram a mulher, de rua em rua, até que a viram chegar a um campo deserto, em frente a um mercado. E viram, enxugando os olhos, enquanto abria as torrentes do seu pranto, a “cadela”, “pervertida” e “degenerada”, que, saía todas as noites, mergulhada nas trevas, a disputar com os porcos, no lixão do mercado, frutas estragadas, para matar a fome dos três filhos, que todas as noites adormeciam de fome..