Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Arthur Azevedo domingo, 28 de janeiro de 2018

A NOTA DE CEM MIL-RÉIS

 

A NOTA DE CEM MIL-RÉIS

Arthur Azevedo

 

 

O Cavalcanti era um marido incorreto, para não empregar um adjetivo mais forte; imaginem que os seus recursos não davam para acudir a todas as necessidades da família e, no entanto, era ele um dos amantes da Josephine Leveau, uma cocotte francesa, cujo nome era muito conhecido nas rodas alegres, e se prestava aos trocadilhos mais interessantes, quer em francês, quer em português.

 

Como a esposa do Cavalcanti era uma hábil costureira, recorreu à sua habilidade para ajudar nas despesas de casa. Um dia fez um vestido para uma amiga, e, tão bem feito, tão elegante, que a sua fama correu de boca em boca, e valeu-lhe uma freguesia certa, que lhe dava algum dinheiro a ganhar. Havia meses em que ela fazia trezentos mil-réis.

 

O Cavalcanti não protestou, pelo contrário aprovou. Fez mais, como vão ver.

 

Uma bela manhã, a Josephine mandou-lhe pedir cem mil-réis para uma necessidade urgente, e ele não os tinha, nem sabia aonde ir buscá-los. Hesitou durante algum tempo em cometer uma baixeza, mas acabou cometendo-a. Já o leitor adivinhou que o miserável pediu à esposa o dinheiro que devia mandar à amante.

 

A pobre senhora não manifestou a menor contrariedade: foi ao seu quarto, abriu uma gaveta onde guardava o fruto do seu trabalho, e tirou uma nota de cem mil-réis, ainda nova. Antes de levá-la ao marido, que esperava na sala de jantar, contemplou-a durante algum tempo, como para despedir-se dela para sempre, e então notou que alguém escrevera num canto estas palavras com letra miúda: "Nunca mais te verei, querida nota!" E como D. Margarida – ela chamava-se Margarida – tivesse um lápis à mão, escreveu por baixo daquelas palavras "Nem eu!".

 

O Cavalcanti empalmou os cem mil-réis com um estremeção de alegria.

 

– Este dinheiro faz-te muita falta? – Perguntou ele.

– Não – respondeu ela –, hoje mesmo espero receber igual quantia.

 

Meia hora depois, o Cavalcanti entregava a nota, dentro de um envelope, a Josephine Leveau. Nesse mesmo dia, D. Margarida recebeu os outros cem mil-réis que esperava. Contra o seu costume, o Cavalcanti estava em casa.

 

– Olha, disse-lhe ela, aqui estão os cem mil-réis que eu contava receber. A freguesa é boa.

– Quem ela é? – Perguntou o marido.

– Não a conheço; veio ter comigo e pediu-me que lhe fizesse um vestido de seda, riquíssimo. Tinham-lhe dito que eu trabalhava bem e barato.

– Mas é senhora séria?

– Parece. É francesa, e casada com um banqueiro, disse-me ela. Naturalmente, o marido é também francês, porque ela chama-se Madame Leveau.

– Leveau! – Repetiu o Cavalcanti empalidecendo.

– Conheces?

– Não.

– Então, por que fizeste essa cara espantada? Boa freguesa! O vestido foi hoje de manhã cedo, e hoje mesmo veio o dinheiro.

– Onde mora essa Madame Leveau?

– Na Rua do Catete.

 

Dizendo isto D. Margarida abriu o envelope e retirou os cem mil-réis.

 

– Que coincidência! – Disse ela; a nota é da mesma estampa da qual te dei hoje de manhã! Por sinal que a outra tinha no canto... Oh!...

 

Este grito quer dizer que D. Margarida tinha lido a frase "Nunca mais te verei", e o seu acréscimo: "Nem eu!".

 

–  Que foi? – Perguntou o Cavalcanti.

– A nota é a mesma!...

– A mesma? – Repetiu o marido gaguejando.

– A mesmíssima! Reconheço-a por causa destas palavras... Vê! A minha letra!...

 

O Cavalcanti arranjou uma desculpa esfarrapada: disse que tinha pago os cem mil-réis ao banqueiro Leveau, a quem os pedira emprestados; mas D. Margarida não engoliu a pílula, e foi à casa de Josephine certificar-se de que esta era uma cocotte frequentada por seu marido.

 

A pobre senhora separou-se do desgraçado, e abriu casa de modista. Ganha muito dinheiro.


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