Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Poemas e Poesias quarta, 27 de março de 2019

A MÁQUINA DE CHILREAR E SEU UDO DOMÉSTICO (POEMA DO MATO-GROSSENSE MANOEL DE BARROS)

A MÁQUINA DE CHILREAR E SEU USO  DOMÉSTICO

Manoel de Barros

 


IV. A MÁQUINA DE CHILREAR E SEU USO DOMÉSTICO
O POETA (por trás de uma rua minada de seu rosto 
andar perdido nela) 
— Só quisera trazer pra meu canto o que pode ser 
carregado como papel pelo vento

A LUA (com a noite nos lábios) 
— Pelo nome do rosto se apostava que era cálido

O PÁSSARO (olhos enraizados de sol) 
— Ainda que seu corpo permanecesse ardendo, o 
amor o destruiria

O CÓRREGO (perdido de borboletas) 
— O dia todo ele vinha na pedra do rio escutar a 
terra com a boca e ficava impregnado de árvores

O PÁSSARO (em dia ramoso, roçando seu rosto na erva 
dos ventos) 
— Há réstias de dor em teus cantos, poeta, como um 
arbusto sobre ruínas tem mil gretas esperando chuvas…

O CÓRREGO (apertado entre dois vaga-lumes) 
— … como no fundo de um homem uma árvore não 
tem pássaros!

O MAR (encostado na rã) 
— Em cima das casas um menino avino assobia 
de sol!

O SOL (sobre caules de passarinhos e pedras com 
rumores de rios antigos) 
— Iam caindo umas folhas de mar sobre as casas 
dos homens

A ESTRELA (sentada nos ombros de Ezequiel, o 
profeta, em Congonhas do Campo) 
— … e o silêncio escorava as casas!

O POETA (se usando em farrapos) 
— Meu corpo não serve mais nem para o amor nem 
para o canto

O CARAMUJO (olhos embaraçados de noite) 
— E a Máquina de Chilrear, Poeta?

A ÁRVORE (desinfluída de cantos) 
— É possessão de ouriços

A RÃ (de dentro de sua pedra) 
— … sua voz parece vir de um poço escuro

O PÁSSARO (cheiroso som de asas no ar) 
— Ela está enferrujada

A ÁRVORE (apoderada de estrelas) 
— Até o chão se enraíza de seu corpo!

O CÓRREGO (no alto de seus passarinhos) 
— Ervas e grilos crescem-lhe por cima

O PÁSSARO (submetido de árvores) 
— A Máquina de Chilrear está enferrujada e o limo 
apodreceu a voz do poeta

CHICO MIRANDA (na rua do Ouvidor) 
— O poeta é promíscuo dos bichos, dos vegetais, 
das pedras. Sua gramática se apoia em contaminações 
sintáticas. Ele está contaminado de pássaros, de 
árvores, de rãs

A ESTRELA (com ramificações de luar) 
— Muitos anos o poeta se empassarou de escuros, 
até ser atacado de árvore

O POETA (lesmas comendo seus cadernos relógios 
telefones) 
— Ai, meu lábio dormia no mar estragado!

O MAR (restos de crustáceos agarrados em suas pernas) 
— Parecia ter dado à praia como um pedaço de pau

A FORMIGA (carregando um homem na rua, de 
atravessado) 
— Eu vi o chão, era uma boca de gente comida de 
lodo!

O POETA (ventos o assumindo como roupas) 
— Os indícios de pessoas encontrados nos homens 
eram apenas uma tristeza nos olhos que empedravam

O CARAMUJO (se tirando de escuros, cheirando a 
seus frutos)
— Restos de pessoas saindo de dentro delas mesmas 
aos tropeços, aos esgotos, cheias de orelhas enormes 
como folhas de mamona

O CÓRREGO (mudando de passarinhos entardecentes) 
— Mas o que trinca está maduro, poeta

O POETA (ensinado de terra) 
— Amar é dar o rosto nas formigas

A PÁSSARA (nas frondes do mar) 
— Meus filhos também construíram suas casas com 
vigas de chuva

FRANCISCO (cumprimentando aos arbustos) 
— Olhai os cogumelos pondo as bocas!


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