– Depois de velho você ficou relaxado, coisa feia! Não corta o cabelo, unhas grandes, vou contratar manicure. Se eu morrer você vai virar lobisomem. – Vivia reclamando Dona Sílvia aos ouvidos de Fonseca.
Certo sábado, pela manhã, apresentou-se no apartamento uma morena sorridente, Aparecida, manicure. Dona Sílvia tirou o marido da leitura dos jornais na varanda, hora de fazer as unhas. Ele levantou-se, mais para livrar-se da insistente mulher. Sentou-se na poltrona, cumprimentou a manicure, acionou o controle remoto da televisão. Colocou os pés numa bacia de água quente para amolecer as unhas. Dona Sílvia deixou o marido entregue à manicure, foi às compras, sábado é dia de Shopping, encontro de amigas, só retornaria na hora do almoço.
Durante o cortar das unhas, Aparecida alisou a mão de Fonseca de uma forma suave, ele sentiu uma sensação gostosa, carícia no toque de mãos. Olhou para manicure e ficou inquieto ao perceber o generoso decote, seios duros, empinados. Há tempos não se excitava só em olhar uma mulher. Puxou conversa.
– Você é a boa manicure, sabe cortar com suavidade, onde aprendeu essa delicadeza?
– Eu precisava de uma profissão, ganhar dinheiro para me sustentar, tenho uma filha. Uma amiga me ensinou e fiz um curso no SENAC, hoje tenho bons fregueses, não paro de cortar unhas, os clientes gostam. Ser manicure foi muito bom para mim. O que ganho está dando para sobreviver.
– E seu marido, pai de sua filha, não lhe ajuda?
– Tenho marido não. Namorei um vizinho, ele me engravidou, eu era ainda menina, tinha 15 anos. O desgraçado danou-se para o Rio de Janeiro, sonhava ser cantor de rádio e televisão. Há mais de cinco anos não tenho notícias do vagabundo, me disseram que é traficante no morro. Eu moro com minha mãe.
Conversaram bastante. Aparecida contou sua vida, semelhante às jovens da periferia do Nordeste. Ao terminar, ele olhou os pés, as mãos, admirou as unhas simetricamente cortadas, perfeitas. Perguntou o preço do serviço, pagou R$ 35,00, cinco a mais do valor pedido. Aparecida agradeceu, guardou o material. Fonseca ficou encantado com o rebolar do corpo moreno dentro do vestido branco, quase transparente. Ela despediu-se perguntando quando retornava.
– Venha no próximo sábado. – Fonseca disse com entusiasmo.
Na hora do almoço Dona Sílvia inspecionou as mãos, os pés, do marido, aprovou, perguntou se havia gostado da manicure, Fonseca fez-se indiferente, entretanto, a jovem não saía da cabeça.
Fonseca alimentou-se de fantasia, sonhava com a morena acariciando seus pés. Ficava feliz desde sexta-feira. Em conversas enquanto cortava unhas, tornaram-se amigos, íntimos, certa vez ela confessou ter sido garota de programa, não gostou. Numa manhã de sábado, ao pagar a manicure, Fonseca encorajou-se, alisou o pescoço da jovem e deu-lhe um beijo na testa. Ela reclamou baixinho, com ar de cumplicidade: “Não Seu Fonseca, não…” Ele a trouxe num abraço apertado, beijou-lhe a boca. Deitaram-se no tapete comprado na Capadócia, fizeram amor pela primeira vez.
Dona Sílvia ao chegar notou a cara de felicidade do marido tomando uma cervejinha, cantando na varanda, achando o mar e a vida bonita. Convidou a esposa para almoçar fora, variar de comida, de tempero, foram à Barraca Pedra Virada na orla da Ponta Verde, encontraram amigos, passaram uma tarde maravilhosa conversando, uísque de combustível. Ao chegar em casa amaram-se como nunca mais tinham amado. Dona Sílvia, antes de adormecer, conseguiu perguntar: – O que houve com você, hoje?
No sábado seguinte Fonseca conversou sério com a manicure, não ficava bem fazer amor dentro de sua casa, era falta de respeito. Marcou, estabeleceu com Aparecida. Uma vez por semana, eles se encontram para uma deliciosa tarde de amor num motel. Dentro do apartamento nunca mais aconteceu. Afinal Fonseca é um cidadão de respeito.