A INTRIGA DO CACHORRO COM O GATO
A intriga é mãe da raiva
O mau pensamento é pai
Da casa da malquerença
O desmantelo não sai
Enquanto a intriga rende
A revolução não cai.
Quando cachorro falava
Gato falava também
Gato tinha uma bodega
Como hoje os homens têm
Onde vendia cachaça
Encostado ao armazém.
Com a balança armada
Para comprar cereais
E na bodega vendia
Bacalhau, açúcar e gás
Bolacha, café, manteiga
Miudezas e tudo mais.
Quando no tempo de safra
Comprava mercadoria
Chegada no armazém
Que todo bicho trazia
Vou dizer pela metade
Esta grande freguesia.
O peru vendia milho
O porco feijão e farinha
Com um cacho de banana
Mais tarde o macaco vinha
Raposa também trazia
Um garajau de galinha.
Carneiro passava a noite
Junto com sua irmã
Descaroçando algodão
E quando era de manhã
Para o armazém do gato
Botava sacos de lã.
Guariba vendia escova
Que fazia do bigode
Urubu vendia goma
Porque tem de lavra e pode
A onça suçuarana
vendia couro de bode.
Então todo bicho tinha
No armazém seu contrato
Porém vamos deixar isto
Para tratar de outro fato
Relativo à intriga
Do cachorro com o gato.
Rei leão mandou cachorro
Efetuar uma prisão
O cachorro passando
Na venda do gato então
Pediu para beber fiado
E o gato disse: pois não.
Subiu na prateleira
Uma garrafa desceu
Um cruzado de cachaça
O cachorro ali bebeu
Botou fumo no cachimbo
Pediu fogo e acendeu.
E disse compadre gato
Eu vou prender o preá
Porque carregou a filha
Do coronel cangambá
E mesmo já deve a honra
Da filha do seu guará.
E tornou dizer compadre
Bota mais uma bicada
Eu só sei prender valente
Depois da gata esporada
O gato sorriu e disse:
Esta não lhe custa nada.
O gato bebeu também
O cachorro repetiu
Botou o copo na banca
Saiu na porta e cuspiu
O gato puxou um lenço
Limpou a barba e tossiu.
Embebedaram-se os dois
Garrafas secaram três
Cachorro fez um discurso
Falava em língua inglês
Gato embolava no chão
Também falando francês.
A gata mulher do gato
Saiu do quarto veio cá
E disse muito zangada
Vocês dois procedem mal
O gato disse: mulher
Da porta do meio pra lá.
O gato ficou deitado
O cachorro foi embora
Ouviram dizer: ô de casa
A gata disse: ô de fora
E quem é respondeu raposa
Sou eu que cheguei agora.
Disseram entre comadre
O gato levantou-se
Sentou-se numa cadeira
Esposa também sentou-se
Ele contou à raposa
De que forma embebedou-se.
A raposa disse: compadre
Você não pensou direito
Bebendo com o cachorro
Um safado sem respeito
Se seus amigos souberem
O senhor perde o conceito.
Beba com os seus amigos
Seu irmão maracajá
O tenente porco-espinho
E o capitão guará
Major porco e doutor burro
E o coronel cangambá.
Eu também gosto da troça
Bebo, danço e digo loas
Mas com gente igual a mim
Civilizadas e boas
Que não vou andar com gente
De qualidade à-toa.
Só me dou com gente boa
Como compadre urubu
Dona ticaca de souza
E dona surucucu
A professora jiboia
E o meu primo timbu.
Você é conceituado
Da roda palaciana
Cachorro vive na rua
Tanto furta como engana
Com o baralho no bolso
Jogando e bebendo cana.
E ele compra fiado
Porque quer mas ele tem
Uma mochila de níquel
Que por detrás se vê bem
Pendurada balançando
Porque não paga a ninguém.
O gato se pôs em pé
Perguntou admirado
Comadre, isto é verdade?
Ele me deve um cruzado
Eu não dei fé na mochila
Por isto vendi fiado.
Porém eu vou atrás dele
Daquele cabra estradeiro
Dou-lhe um bote na mochila
Arranco e tiro o dinheiro
Sendo eu disse a raposa
Passava o granadeiro.
O gato se preparou
Amarrou o cinturão
Correu as balas no rifle
Passou lixa no facão
Botou um quarto e bebeu
De aguardente com limão.
Chegou lá disse ao cachorro:
É triste o nosso progresso
Você paga o meu cruzado
Ou quer que eu pague um processo
Cachorro afastou o pé
E lhe disse eu não converso.
Ali deu um tiro e disse:
É assim que eu despacho
Porém o gato abaixou-se
Passou-lhe o rifle por baixo
Deu-lhe uma balada certa
Que quase derruba o cacho.
O cachorro que também
Tem pontaria fiel
Tornou passar a pistola
A bala deu um revel
Cortou-lhe o rabo no tronco
Que descobriu o anel.
Depois que trocaram tiros
Divertiram no punhal
Pulava o gato de costas
E dava salto mortal
Cachorro por sua vez
Também traquejava igual.
E ali trancou-se o tempo
Na porta do barracão
Da baronesa preguiça
Comadre do rei leão
E ela telegrafou
Pedindo paz na questão.
O leão passou depressa
Um telegrama pra trás
Minha comadre alevante
A bandeira e grite paz
Ela não tinha bandeira
Levantou a macaxeira
E ali ninguém brigou mais.