A IGREJA SERTANEJA
CULTURAL, SEM FINS RELIGIOSOS, COMERCIAIS, LUCRATIVOS OU FINANCEIROS
Raimundo Floriano
(Publicado no dia 28.06.2020)
Em meados do ano de 1972, impressionadíssimo com as aprontações contidas no livro O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, de Ariano Suassuna, publicado em 1971, eu, recém-desquitado, para fazer figura frente aos alunos da UDF, onde iniciara o Curso Superior de Contabilidade, fundei, juntamente com outros colegas presepeiros, a Igreja Sertaneja, seita cultural, sem caráter religioso.
Seus templos agregavam todos os bares, botecos e biroscas de Brasília onde se pudesse consumir uma boa cachaça – e todas as marcas brasileiras são de excelente qualidade –, e também pequenos teatros, circos mambembes, casas de forró, rodas de samba, desafios, pelejas repentistas, cantorias, bumba meu boi, vaquejadas e qualquer espaço onde a Cultura Brasileira dominasse de ponta a ponta.
Vaqueiros na folgança: seminaristas da Igreja Sertaneja
Imediatamente, convidei o amigo Luiz Berto, companheiro de grandes aventuras, a dela fazer parte, o que foi aceito de imediato. Passamos a ser chefes supremos, equivalentes, sem subordinação hierárquica um ao outro, no grau de Antístites – Bispos, como nas inúmeras outras seitas que surgiram depois dela.
(O que só vim a saber, no ano de 2016, é que Luiz Berto, naquele tempo, também influenciado por Ariano, já nutria o mesmo desejo de fundar uma Igreja Sertaneja. Mas esse segredo ele o manteve consigo.)
A brincadeira tomou fôlego, consolidou-se. Tínhamos um jornal, O Gole, onde esbanjávamos criatividade e bom humor.
Já por aquela época, órgãos da grande mídia, como O Globo, Jornal do Brasil, Estadão e até o The New York Times, da imprensa norte-americana, eram detentores da supremacia editorial, com sua abrangência e circulação planetária. Não podendo competir com tamanha magnitude nacional e internacional, nosso pequenino O Gole viu-se obrigado a cerrar suas portas.
O tempo correu, e a Igreja Sertaneja conheceu um certo arrefecimento, até porque eu havia constituído nova família, à qual passei a dedicar-me integralmente.
Em abril de 2005, com a sagração do Papa Bento XVI, Sumo Pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana, Luiz Berto, inteligente e criativo por demais, inspirou-se no nome e autodenominou-se Papa Berto, da ICAS - Igreja Católica e Apostólica Sertaneja, sendo sua esposa Papisa, e com um sucessor, seu filho caçula, conhecido como Papinha.
A IS - Igreja Sertaneja, da qual sou a autoridade máxima, não tem sucessor e perdurará apenas durante o tempo de vida que Deus, em sua infinita bondade, está me concedendo.
(Cabe aqui esclarecer que, na Igreja Católica Apostólica Romana, da qual sou fiel devoto praticante, só existem 3 graus: diácono, padre e bispo. Cônego, monsenhor, cardeal e papa são apenas títulos. Por isso, o Papa Francisco é o Bispo de Roma. Igualmente, meu título de Cardeal é apenas honorífico, pois continuo no grau de Bispo Sertanejo.)
Paralelamente, fundei, a 24 de junho de 1972, a Banda da Capital Federal, da qual eu era o mestre, e Luiz Berto, o contramestre, destinada a animar o carnaval de rua de Brasília. Essa banda, com estandarte e uniforme, existe até hoje, apresentando-se apenas em ocasiões muito especiais.
A BANDA DA CAPITAL FEDERAL, EM 2002
30º ANIVERSÁRIO E FESTA DO PENTA
Raimundo - Batista - Teixeira - Jambeiro - Gedeon - Dionísio - Celso Martins
Fideles - Élton - Marcos - Carioquinha
A Igreja Sertaneja e a Banda da Capital Federal muito deram o que falar, pois os fiéis de uma eram componentes da outra. Na Igreja Sertaneja, havia muitas ovelhinhas a apascentar. Já na Banda da Capital Federal, as folionas se pegavam no tapa, decidindo quem saía com o estandarte!
Também fazíamos parte da Diretoria do Bloco de Sujos Sumo do Guará, que fornecia sambistas para Escola de Samba Acadêmicos da Asa Norte e passistas para o bloco de frevo As Pás Douradas.
Arrefeceram-se um pouco os ânimos da Igreja Sertaneja depois de nossa aposentadoria, cada qual procurando apegar-se a alguma atividade que preenchesse suas extensas horas de ócio.
Luiz Berto, já escritor, danou-se a escrever mais livros e lançou o Jornal da Besta Fubana, virtual, com milhares de leitores diários. Eu, 10 anos mais velho, portanto mais devagar, devagarinho, também mergulhei na atividade literária, lançando meus livrinhos e editando o Almanaque Raimundo Floriano, que vai seguindo firme, com a ajuda de seus colunistas e leitores.
Agora, na quarentena ditada pela pandemia, resolvi tirar a Igreja Sertaneja do olvido e revitalizá-la, arregimentando novos membros para seu Clero, especialmente os que me vêm ajudando, com suas colaborações e comentários, a manter, na Internet, meu Almanaque, site cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros.
Há uns 30 anos, cumprindo recomendações médicas, estou compulsoriamente afastado da boa cachacinha, um dos itens que deram origem à ideia de criação da seita, consumindo apenas refrigerante diet.
Em compensação, convivo com pessoas de alto quilate, com o talento das quais a Igreja Sertaneja tem-se expandido, arrebanhando a cada dia mais fiéis: cantores, músicos, escritores, poetas, compositores e escribas, além de boêmios e seresteiros, no Brasil e no Exterior, o que se comprova nos acessos mundiais ao Almanaque Raimundo Floriano.
No próximo dia 3 de julho deste 2020, meu 84º aniversário, farei novas ordenações para o Clero da Igreja Sertaneja, com o intuito não só de premiar quem já abraçou, com força e ânimo, meu movimento cultural, como para que os fiéis recém-chegados façam com que a Igreja Sertaneja e o Almanaque Raimundo Floriano cresçam mais e mais.