O Poeta pernambucano de Caruaru Ivanildo Vilanova, um dos maiores nomes da cantoria nordestina na atualidade
É o céu uma abóbada aureolada,
Rodeada de gases venenosos,
Radiantes planetas luminosos
Gravidade na cósmica camada!
Galáxia também hidrogenada,
Como é lindo o espaço azul-turquesa
E o sol, fulgurante tocha acesa,
Flamejando sem pausa e sem escala!
Quem de nós pensaria em apagá-la?
Só o Santo Autor da Natureza!
De tais obras, o homem e a mulher
São antigos e ricos patrimônios.
Geram corpos em forma de hormônios,
E criam seres sem dúvida sequer.
O homem, após esse mister,
Perpetua a espécie, com certeza.
A mulher carinhosa e indefesa
Dá à luz uma vida, novo brilho,
Nove meses, no ventre, aloja o filho,
Pelo Santo Poder da Natureza!
O peixe é bastante diferente:
Ninguém pode entender como é seu gênio!
Ele reserva porções de oxigênio
E mutações para o meio ambiente!
Tem mais cartilagem resistente
Habitando na orla ou profundeza,
Devora outros peixes pra despesa
Tem a época do acasalamento
Revestido de escamas, esse elemento,
Com a força da Santa Natureza!
O poraquê ou o peixe elétrico, é um tipo genuíno,
Habitante dos rios e águas pretas,
E com ele possui certas plaquetas
Que o dotam de um mecanismo fino!
E com tal cartilagem, esse ladino
Faz contato com muita ligeireza,
E quem tocá-lo padece de surpresa
Descarga mortífera, absoluta,
Sua alta voltagem eletrocuta,
Com os fios… da Santa Natureza!
A tartaruga é gostosa, feia e mansa,
Habitante dos rios e oceanos!
Chegar aos quatrocentos anos
Pra ela é rotina… é confiança!
Guarda ovos na areia e nem se cansa
De por eles zelar como defesa.
Nascido os filhotes, com presteza,
Nas águas revoltas já se jogam,
Por instinto da raça não se afogam
E também pelo Poder da Natureza!
O canário é pássaro cantor,
Diferente de garça e pelicano.
Papagaio, arara e tucano,
Todos eles com majestosa cor!
O gavião é um tipo caçador
E columbiforme é a burguesa,
O aquático flamingo é, da represa,
A ave, a rapace agigantada,
Eis o mundo das aves, a passarada
Quanto é grande, poderosa e bela, a Natureza!
A gazela, o antílope e o impala
A zebra e o alce, felizardo,
Não habitam em comum com o leopardo,
O leão e o tigre-de-bengala!
O macaco faz tudo mas não fala,
Por atraso da espécie,ou por franqueza,
Tem o búfalo aspecto de grandeza,
O boi manso e o puma tão valente,
Cada um de uma espécie diferente
Isso é coisa também da Natureza!
E acho também interessante
O réptil de aspecto esquisito
O pequeno tamanho de um mosquito,
A tromba preênsil do elefante
A saliva incolor do ruminante
A mosca nociva e indefesa
A cobra que ataca de surpresa
Aplicar o veneno é seu mister:
De uma vez mata trinta, se puder
Mas é coisa também da Santa Natureza!
No Nordeste há quem diga que o carão
Possui certos poderes encantados
E, que, através de fenômenos variados,
Prevê a mudança de estação.
De fato, no auge do verão,
Ele entoa seu cântico de tristeza
E, de repente, um milagre, uma surpresa:
Cai a chuva benéfica e divina!
Quem lhe diz, quem lhe mostra, e quem lhe ensina?
É somente o Autor da Natureza!
Quem é que não sabe que o morcego
Com o rato bastante se parece?
Nas cavernas escuras sobe e desce
Sugar sangue dos outros é seu emprego!
Às noites escuras tem apego,
Asqueroso ele é, tenho certeza.
Tem na vista sintoma de fraqueza
Porém, o seu ouvido é muito fino:
Também tem um sonar, aparelho pequenino,
Que lhe deu o Autor da Natureza!
Admiro a formiga pequenina,
Fica tal inimiga da lavoura.
No trabalho, aplicada professora,
Um exemplo de pura disciplina!
Através das antenas se combina
Nos celeiros alheios faz limpeza.
Formigueiro é a sua fortaleza
Onde cada uma delas tem emprego,
Uma entra, outra sai, não tem sossego
Quanto é grande e bonita a Natureza!
E a aranha pequena, tão arguta,
De finíssimos fios faz a teia
Nesse mundo almoça, janta e ceia
É ali que passeia, vive e luta!
Labirinto intrincado ela executa
Seu trabalho é bordado em qualquer mesa.
Quem pensar destruir-lhe a fortaleza
Perderá de uma vez toda a esperança,
Sua rede é autêntica segurança
Operária das Mãos da Natureza!
A planta firmada no junquilho:
Begônia, tulipa, margarida,
As pedras riquíssimas da jazida
Com a cor, o valor, a luz, o brilho.
A prata e o ouro cor de milho,
O brilhante, a opala e a turquesa
A pérola das joias da princesa
É difícil, valiosíssima e até
Alguém pensa ser vidro, mas não é:
É um milagre da Santa Natureza!
O inseto do sono tsé-tsé
As flores gentis, com seus narcóticos,
As ervas que dão antibióticos,
A mudança constante da maré!
A feiura real do caburé,
No pavão é enorme a boniteza,
Tem o lince visão e a agudeza
E o cachorro, finíssima audição!
Vigilante mal pago do patrão,
Isso é coisa da Natureza!
A cigarra cantante dialoga
Através do seu canto intermitente.
De inverno a verão canta contente
E a sua canção não sai de voga!
Qualquer árvore é a sua sinagoga
Não procura comida pra despesa
Sua música é sinônimo de tristeza
“Patativa da Seca” é o seu nome
Se deixar de cantar morre de fome
Mas a gente sabe que é da Natureza!
* * *
Ivanildo Vilanova pelejando com Severino Feitosa sobre o tema
Canta quem souber cantar
Ivanildo Vilanova
Antes que apareça mote,
Poema, rojão e glosa,
Eu quero ver se Feitosa
Aguenta também meu trote,
Saber se seu holofote
Tem claridade estrelar
E dá água no seu mar
E cabe meu barco potente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.
Severino Feitosa
Não gosto de exageros,
Não tenho sangue de persa,
Muito menos de conversa
De qualquer um bagunceiro,
Não quero que o companheiro
Venha me desafiar,
Eu aqui neste lugar
Só tenho amigo e parente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.
Ivanildo Vilanova
Sua voz é de tenor
E sua presença é de artista,
Você como repentista
Pode até ter um valor,
E com outro cantador
Você pode até triunfar,
Mas é bom se incomodar
Quando me vê pela frente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.
Severino Feitosa
Se você possui cuidado
No papel de cantador,
E se acaso o colega for
Hoje decepcionado,
Regresse pra seu estado,
Pode até se preparar,
E quando um pouco decorar,
Venha que estou novamente,
Comigo o rojão é quente
Canta quem souber cantar.
Ivanildo Vilanova
Eu devia cobrar taxa
E além de taxa o juro,
Pra cantador sem futuro
Que comigo se esborracha
Pois hoje aqui você acha
Um santo pra seu altar,
Água pra seu alguidar
E vinho pra sua corrente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.
Severino Feitosa
Você teve algum cartaz
Naquele tempo passado,
Mas foi desclassificado
Em diversos festivais,
Hoje em dia está pra trás
Que nem sabe mais falar,
Antes era titular
E hoje é reserva somente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.
Ivanildo Vilanova
Mas eu achei que seu dito
Foi muito mal empregado,
Só fui desclassificado
Em São José do Egito,
Mas não me deixou aflito
Nem me tomaram o lugar,
Não digo que foi azar
Pois foi marcação somente,
Comigo o rojão é quente
Canta quem souber cantar.
Severino Feitosa
Eu que tenho poesia
Pra cantar a vida inteira,
Porque a minha bandeira
Desfraldada é mais sadia,
E tenho em minha companhia
Jesus pra me ajudar
E você para escapar
Não vai dizer que é gente,
Comigo o rojão é quente,
Canta quem souber cantar.