Ninguém sabia seu nome, que dirá sobrenome. Os amigos conheciam como Pafinha, apelido carinhoso. Moça bonita de pele clara, cabelos escuros escorridos, olhos vivos, meio estrábicos, harmonizavam com a boca rosada permanentemente num debochado sorriso. Pafinha tinha a beleza da juventude e a graça de quem é feliz.
Corpo miúdo, curvas nítidas, cintura fina e seios abundantes faziam dessa menina uma mulher atraente. A bunda bem torneada era desejo e fantasia de muitos homens.
Todos amavam aquela jovem com ar de moleca sapeca. Vivia a vida como se fosse acabar amanhã. Pafinha trabalhava na Boate Tabariz, era a rapariga predileta do mais famoso proxeneta da noite de Maceió, o popular Mossoró.
Nativa de Pariconha, sertão das Alagoas, sua família passava fome com a seca. Aos 14 anos havia conhecido apenas miséria e pobreza. Um cabo de polícia a estuprou, prometeu aos pais amigação, uma casa na capital. Deixou-a na zona das putas em Jaraguá.
Tornar-se prostituta foi uma grande transformação. Cursou a Universidade da Vida. Era a mais querida do cabaré, conhecia e tratava os frequentadores da boate pelo nome. Podia ser senador, deputado, coronel ou capitão. Era o xodó de Jaraguá.
Ela tinha um namorado, apaixonou-se por um jovem deputado, menino novo que fez uma bela carreira política. Quando o deputado aparecia, se ela estivesse acompanhada, depois de atender o cliente, corria para os braços de seu amor.
Naquela época havia um bingo aos domingos, fonte de recurso para construção do estádio Trapichão, os prêmios eram carros e caminhões. Mossoró levava suas meninas para marcar o bingo. Pafinha teve sorte, ganhou um carro IMPALA. Um conhecido senhor negociava prêmios de bingos, comprou o carro na hora. Dinheiro que Pafinha jamais pensou possuir.
Naquela noite ela iniciou uma festa no bairro boêmio de Jaraguá. Todos queriam abraçá-la ou pedir dinheiro emprestado. A festa durou oito noites. Pafinha não tinha noção de economia, seu coração solidário e generoso emprestou e deu muito dinheiro. Deu festa no Verde, no Duque e no Sovaco do Urubu, a ZBM, Zona do Baixo Meretrício, frequentada por estivadores, pescadores, catraieiros, os pobres amigos de copo e de cruz.
Uma semana de alegria e diversão durou a festa de Pafinha. Só acabou quando ela percebeu que não tinha mais um centavo do dinheiro do bingo. Ficou pobre de novo.
Quando assisti ao filme dinamarquês, A Festa de Babete, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro lembrei-me da Festa da Pafinha, histórias semelhantes. A vida imitando a arte.
Nós, jovens moradores da praia da Avenida da Paz, depois do futebol e de um bom mergulho, caminhávamos sobre a areia molhada até uma birosca em frente ao Primeiro Trapiche em Jaraguá para entornar uma boa cachacinha com caju.
Nossas companhias eram os embarcadiços, pescadores, desocupados, desempregados. As raparigas de Jaraguá, mergulhavam se refrescando, lavando-se da noitada anterior.
Pafinha sempre presente ajudava a comer o delicioso tira-gosto de panã ou arabaiana contando casos da noite no cabaré. Seu Rodolfo, velho pescador, contava historias sobre peixes enormes, sobre a mãe d’água, sereias, afogamentos, botos salvando vidas empurrando os afogados até a praia.
Pafinha aprendeu a nadar, boiava e mergulhava se purificando na água do mar até o pôr-do-sol alaranjar o céu, depois das seis da tarde era hora de trabalho no Cabaré. A sertaneja dizia estar no Oceano seu destino.
A história da Pafinha ainda hoje é contada nas biroscas de Jaraguá. Tornou-se lenda, contam que ela desapareceu num banho de mar, deixou-se levar pela correnteza, Yemanjá veio buscá-la, transformou-a em um boto que vagueia vigilante no mar, salvando os afogados.
Há muito tempo não acontece afogamento no mar da Avenida da Paz. Um boto nas águas perto do cais mergulha vigilante, empurrando para praia os banhistas desavisados ou crianças mais afoitas. Depois volta junto ao cardume, brincando alegre com seus pareias.
À noite, nos bares do mercado e na zona da boemia, marinheiros, pescadores, contam histórias de salvamentos milagrosos. Atribuem esses milagres à Santa Pafinha, protetora das putas, dos boêmios, dos cachaceiros, dos bêbados e afogados de Jaraguá.
ESSA HISTÓRIA E MAIS OUTRAS SOBRE A CIDADE DE MACEIÓ, SERÃO CONTADAS POR CARLITO LIMA E CANTADAS POR ANDRÉA LAÍS DIA 9 DE JUNHO NO TEATRO DO CINE PAJUÇARA ÀS 20 HORAS. IMPERDÍVEL. INFORMAÇÕES: (82) 9.9318.0843.