14 de janeiro de 2020 | 03h00
É desconcertante a notícia, revelada pelo Estado, de que o Ministério da Educação (MEC) estuda descartar 2,9 milhões de livros didáticos, comprados por meio do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) e que nunca foram utilizados. Adquiridos para serem entregues a alunos de escolas públicas municipais e estaduais, esses livros correm o risco de serem destruídos sob a alegação de que estariam desatualizados e de que o custo de armazenamento seria alto demais. Vinculado ao MEC, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) alertou no ano passado para a necessidade de reduzir o estoque no depósito alugado dos Correios, em Cajamar (SP).
Se o descarte for de fato a medida mais adequada – por exemplo, se os livros estão realmente desatualizados, não fazendo sentido guardá-los para os anos seguintes –, a sua compra provavelmente terá sido um verdadeiro escândalo de má gestão do dinheiro público, a merecer rigorosa apuração. Recursos públicos que deveriam ter sido destinados à educação, ou seja, que deveriam ter contribuído para um melhor aprendizado dos alunos foram duplamente desperdiçados, seja pela compra de livros que nunca foram utilizados, seja pelo investimento em armazenamento de algo que não teve nenhuma serventia. Há exemplares que estão armazenados há 15 anos.
Se todo recurso público precisa ser acompanhado de perto, para avaliar se chegou ao destino devido e se produziu o resultado esperado, ainda mais rigoroso deve ser o controle em relação a recursos públicos destinados à educação. Não cabe o mínimo descuido em área absolutamente relevante para o desenvolvimento econômico e social do País. Com a educação pública no atual patamar, é um acinte desperdiçar recursos que, não fossem o descaso e a má gestão, poderiam ter contribuído para uma melhor educação e um melhor futuro das novas gerações.
Mas até o momento não há evidência de que a destruição dos 2,9 milhões de livros didáticos seja de fato a melhor solução. Falta informação segura e sobram dúvidas sobre o material armazenado. Descartar, sob essas circunstâncias, toda essa quantidade de livros – estima-se um custo médio de R$ 7 por exemplar, o que representaria um montante de R$ 20,3 milhões – seria ainda mais escandaloso.
O próprio FNDE, que alertou para a necessidade de reduzir o estoque de livros didáticos, reconhece não saber a quantidade total de exemplares armazenados. O órgão sugere, assim, montar uma comissão para levantar o número exato de livros e a validade desse material. Há aqui um ponto relevante. Dinheiro público foi gasto para comprar livros didáticos, mas o MEC não sabe o que tem no seu estoque de livros. No mínimo, tem-se uma gestão ineficiente.
Além disso, se o governo não sabe a quantidade de livros de que dispõe, muito provavelmente também não sabe o conteúdo desses livros. Supor que estão desatualizados simplesmente pelo transcorrer do tempo é uma atitude temerária. Segundo o Estado apurou, nesses 2,9 milhões de livros ainda embalados, há exemplares de todas as disciplinas e de todas as séries do ensino fundamental e do ensino médio. Ora, as leis da física, da matemática e da química não sofreram especiais alterações desde 2005. Destruir livros que tratam dessas matérias seria, portanto, um caro absurdo.
Seja qual for o melhor encaminhamento a ser dado ao estoque de livros didáticos, fica evidente a necessidade de aprimorar a gestão pública dos gastos com a educação. Livros não são descartáveis. Dinheiro público não é descartável. O futuro dos jovens que estudam na rede pública não é descartável.