Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

José de Oliveira Ramos - Enxugando Gelo segunda, 11 de novembro de 2019

A CRISTA DE GALO E O VRRRRUUUUM DA INHAMBU

 

 

A “CRISTA DE GALO” E O VRRRRUUUUM DA INHAMBU!

Pirão de farinha seca da “crista de galo”

Era habitual, antes de botar a tramela na porta do galinheiro, auxiliada com a claridade da lamparina, conferir se todas as galinhas e os três galos estavam ocupando seus devidos e tradicionais lugares. Isso, era o que faziam, pela ordem natural da vida, a minha bisavó Naname, minha avó Raimunda, e minha mãe Jordina. Tradição familiar.

E, naquele começo de noite, após a contagem, o caixa não fechou. Os números não batiam, haja vista que dois lugares estavam “desocupados”. Mas, pelo menos naquela noite, quem estivesse fora do galinheiro continuaria assim.

– Tá fartando duas galinhas, Zezim! Amanhã bem cedim a gente percura elas!

Recolhemos a lamparina, fechamos a tramela do galinheiro e depois a porteira do chiqueiro, e voltamos para casa – pois agora precisávamos forrar o estômago antes de dormir. Foi, na volta para casa, que descobri que Vovó trazia numa das mãos, três ovos que havia pego no galinheiro.

– Zezim vá dizê pro seu Avô prumode não drumir, que vou fazê o dicumê!

Ovo cozido com a gema mole

O “dicumê” a caminho da preparação, era a famosa “crista de galo”, alimento emergencial que se consome há tempos em muitas casas desse país. E, não é “alimento” apenas para os pobres. Bem preparado, tem a preferência de muita gente.

Panela (no nosso caso, panela de barro) no fogo. Água, sal a gosto, pimenta do reino moída, coentro e cebolinha picados, uma colher de sopa de banha de porco ou manteiga real, ou, ainda, manteiga de garrafa.

Tão logo começa a fervura da água, com cuidado coloca-se um ovo sem casca e espera-se que a clara cozinhe. Em seguida, retira-se o ovo com cuidado para não “espocar” a gema. Separa-se, e repete-se a mesma coisa com quantos ovos forem necessários.

Cozidos os ovos, faz-se o pirão (angu, para muitos) e serve-se ainda quente. No prato, sobre o pirão, acrescenta-se os ovos, em seguida “espoca-se” os ovos permitindo, aí sim, que a gema cubra o pirão. Sirva-se!

Inhambu – ave da roça

Ao amanhecer do dia, tão logo o galo começa cantar, a rotina diária da casa recomeça. Café preto para uns, com leite para outros, batata doce cozida, cuscuz com nata de leite, abóbora cozida, à qual se junta o leite “vaquino” – eu sempre preferi o leite “caprino” – e vamos à luta.

Terminado o café, foice na mão, bornal no ombro, chapéu na cabeça e é iniciada a procura das duas galinhas poedeiras pertencentes ao “rebanho” da matriarca. A gente sabe que, “rebanho” é mais usado para os bois.

Poucos minutos de procura, e já se percebe que uma chuva fina caiu durante a noite, formando um orvalho poético aos olhos de quem gosta do verde das folhas, em detrimento do amarelado propício às queimadas, possibilitando que a brisa refrescante massageie o rosto e faz aspirar aquele cheiro gostoso e inconfundível da terra molhada.

Repentinamente, aquele momento poético de tantos versos gonçalvinos é interrompido na primeira curva que a vereda do caminho oferece na direção do mato à dentro, e do açude novo.

– Vrrrruuuummmmm!

– Vrrrruuuummmmm!

Provocando um grande susto, mas avisando que ali existia vida, um belo casal de inhambu levanta voo, transformando as asas em poderosas turbinas movidas pela natureza da vida e do universo.

O casal de inhambus aproveitava algumas sementes ainda em flor, que a neblina e o peso do orvalho haviam derrubado e apareciam limpas no caminho.

Andamos procurando a manhã toda. As duas galinhas poedeiras da Vovó não foram encontradas, sem deixar dúvidas que, mais uma vez, a raposa se fartara na preservação das espécies.

Ficava a certeza que, a partir daquele dia, o dicumê noturno feito com “crista de galo” teria alguns ovos a menos.


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