Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

José de Oliveira Ramos - Enxugando Gelo domingo, 11 de junho de 2017

A CAMPAINHA PASSERIFORME

Xexéu – o pássaro brasileiro que imita tudo

Era uma rua antiga no bairro. Bem antiga e importante, por que servia de parâmetro indicativo para muita gente.

Tipo: fica próximo da Rua Jambeiro!

Era uma referência, inclusive para os carteiros dos Correios. Nessa rua ficava a casa 38. Casa da Dona Amelinha, a mais antiga moradora da rua e do bairro. Chegara ali por volta dos anos 50 e viu progredir várias gerações da sua árvore genealógica e de outras famílias. Seu Gonzaga e Dona Amelinha, era o casal proprietário da casa 38.

Antes que ali chegassem Seu Gonzaga e Dona Amelinha, que vieram da Vila Santa Quitéria, uma espécie de condomínio fechado (nos dias de hoje) e casas contíguas, a Rua Jambeiro fora bastante arborizada e, claro, entre as árvores uma porção de jambeiros. Daí o nome da rua, que, na verdade, era oficialmente denominada de Rua Presidente Prudente de Moraes. Mas o povo resolveu chamar definitivamente de Rua Jambeiro.

Mudar pra quê?

Durante anos, Seu Gonzaga manteve instalada uma campainha afixada na porta frontal da casa, com o objetivo de facilitar o atendimento a quem chegava – devido o tamanho da casa – para alguma visita. Também durante anos, na alameda central que dividia a Rua Jambeiro em duas, existiu um jambeiro que, sem qualquer explicação, produzia mais jambos que os demais. E, também floria mais que o normalmente esperado. Ficava na frente da casa, dividindo a rua, aquele tapete róseo em toda a época da floração.

Eis que, chegou o dia da volta eterna de Seu Gonzaga. Dona Amelinha enviuvara, e, praticamente, passou a morar só, naquele casarão. Os filhos e netos pouco vinham visita-la. Era uma solidão enorme. Não demorou muito, e até o jambeiro secou, envelheceu e quebrou.

Inexplicavelmente, durante anos e quase todos os dias, sempre por volta das 10 horas, a campainha da casa 38 tocava. Tocava repetida e insistentemente. Dona Amelinha levantava da velha cadeira de balanço, caminhava demoradamente para atender o toque da campainha. Abria a porta e não encontrava ninguém.

E, não havia ninguém, mesmo. No telhado da casa, pousado num velho galho seco do antigo jambeiro, um xexéu cantava todo dia, imitando a campainha que, durante anos ouviu tocar a aprendeu. Demorou para Dona Amelinha perceber. Por anos, achava que Seu Gonzaga chegava para leva-la junto.

Feijão com nada

A única panela fazendo a única comida

Chove. Chove? Chove, chuva! Chove sem parar.

Ainda que não chovesse, o sertanejo se “armava” com uma desgastada enxada e, sem pau-de-arara, ônibus, trem, metrô ou vlt, caminhava todo dia para o “escritório roçal”. O objetivo sempre foi produzir. Produzir algo relevante. Produzir muito do que você – que, sem enxada, vai navegando no carro importado, na boa estrada e no ar refrigerado – vai comer. Feijão, batata, aves e carnes.

Não. Isso não é o toma-lá, da-cá. Essa é apenas uma das misturas infames que os ditos humanos impõem uns aos outros: a desigualdade social.

Muitos desses, que produziram e continuarão produzindo o que todos vão comer, ao final da vida terrena são carregados para a última morada numa rede velha rasgada, enquanto outros vão num caixão de ipê transportado numa limusine.

Haverás de perguntar: que diferença faz, se os dois morreram?

Não. Não falamos da morte nem do pós-morte. Falamos do usufruto e da vida que os dois levam antes de caminharem para o jazigo.

E aí esquecemos tudo, e vamos ao feijão. Fava rajada, feijão sempre verde, feijão carioquinha, feijão mulatinho e tantos outros feijões temperados com paio, charque, linguiça calabresa, toucinho, pé de porco, costelinha de porco – mas isso é para você. É na sua mesa.

Aquele que planta, cuida e colhe está mesmo é comendo feijão com nada. Acrescenta apenas o sal – o que já alguma coisa.


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