A ADÚLTERA
Humberto de Campos
Regressava Jesus, naquela tarde, do monte das Oliveiras, quando, em meio do caminho, com o sol a esconder-se, ao longe, no leito de fogo das montanhas, foi rodeado por um pequeno grupo de fariseus, que traziam de rastros, pálida e desgrenhada, uma pobre mulher que se debatia entre eles. Supondo confundir o Rabino com a sua consulta inesperada, um escriba, de nome Barachias, adiantou-se dois passos, e pediu, com fingida humildade:
— Mestre, esta mulher foi surpreendida a trair o esposo, a quem jurara fidelidade. A lei de Moisés determina que ela seja apedrejada, e morta pela multidão. Que devemos fazer?
Jesus, que lhe ouvira o coração antes de lhe escutar a palavra, baixou-se na areia da estrada, e pôs-se, com o dedo, a escrever.
— Mestre — tornou o fariseu, — esta mulher foi apanhada em flagrante, traindo o seu esposo. Devemos matá-la à pedrada, como estabelece a lei de Moisés?
Jesus, em silêncio, continuava a escrever sobre a areia, quando, de repente, erguendo-se, respondeu:
— Só o justo pode punir o pecador. Aquele, pois, que, dentre vós nunca pecou, atire a primeira pedra!
A estas palavras, Barachias desapareceu, e, com ele, um a um, aqueles que o acompanhavam, ficando no caminho, apenas, Jesus e a pecadora. Agradecida e assustada, ia a mísera atirar-se de joelhos para beijar as sandálias do Mestre, quando o Rabino a deteve pelos braços, dizendo-lhe, severo:
— Nada me deves, mulher. Em verdade te digo, que as leis de meu Pai são mais implacáveis do que as leis de Moisés. Poupei-te a vida porque a própria morte não puniria a tua falta!
E, repelindo-a com a mão, suavemente:
— Anda; vai! A vergonha do teu crime, na tua velhice, será, na terra, o teu castigo!
E, baixando os olhos, continuou, sozinho, a caminho de Jerusalém...