RIO — Zé Katimba saiu clandestinamente da Paraíba ainda criança rumo ao Rio de Janeiro, a bordo de um navio cargueiro junto dos pais. Na chamada Cidade Maravilhosa, o jovem migrante sentiu na pele o preconceito contra nordestinos e a desigualdade social. Mas foi esse contexto que criou um compositor prolífico, sensível e politizado, cuja obra é reverenciada pelo público e por seus pares, como Zeca Pagodinho, Monarco e Martinho da Vila, seu principal parceiro.
— Resolvi contar minha história e cantar minhas músicas — diz o músico.
E suas histórias são muitas. Além de ter vivido em diversos bairros do Rio e em Niterói, Katimba foi um dos fundadores da Imperatriz Leopoldinense. E chegou a ser preso pela Ditadura.
— A gente forganizava o movimento no Teatro Opinião, com as músicas de protesto. Era em pleno regime militar, acabei detido — relembra. — Se tivesse que fazer, faria tudo de novo, porque fiz por amor, e a gente não deve desistir nunca dos nossos sonhos.
O repertório do show virtual traz clássicos como “Martim Cererê” (com Gibi) e “Na minha veida” (com Martinho).
— Vamos também homenagear Chiquinha Gonzaga, Mart’nália e Dona Ivone Lara, além da Simone, nossa Cigarra, que foi quem mais gravou minhas músicas com o Martinho — adianta.
Bem-humorado, Katimba lembra dos tempos difíceis com leveza.
— Era uma época muito dura quando cheguei aqui. E tudo que não prestava era coisa de “paraíba”. No meio desse furdunço todo de preconceito, tive que sobreviver. Eu fui um dos fundadores da escola, mas quem empurrava alegoria e metia mão em cola quente? M as aprendi tudo, desde trabalhar o couro até tocar. Fui passista, mestre-sala, vice-presidente, presidente, puxei corda... Venci, fiz tudo por amor. E só o amor dá nobreza — afirma. — Graças a Deus, insisti. As escolas fazem a maior festa do universo, são nossos patrimônios culturais. E a música é única, pode ser pop, rock, o que for. A cultura popular tem uma sabedoria muito profunda.
O músico conta que ainda tem muito para aprender.
— Pretendo me aposentar aos 100 anos e viver de sambas de amor. Eu quero me formar em aprendiz, quero aprender todos os dias. A essência da vida é essa, aprender e amar.