RIO - “Assim como Cauã encara fazer comédia no filme ‘Uma quase dupla’, você toparia mergulhar num personagem dramático? Sim, não? Justifique!” Tatá Werneck ouve a pergunta do repórter e cai na gargalhada. É esta a pegada da “Entrevista com especialista”, quadro hilário em que ela conversa com pilotos, astrólogos e outros profissionais no “Lady night”, seu talk-show no Multishow, que terá nova temporada gravada em breve.
Especialista em fazer rir, Tatá interpreta, em “Uma quase dupla”, uma policial que precisa trabalhar com um desastrado subdelegado (Cauã Reymond) para solucionar uma série de assassinatos numa cidade do interior. O filme que estreia nesta quinta, 19, é comédia na veia, mas ela tem resposta na ponta da língua para a pergunta acima:
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‘Nas novelas, minha demanda tem sido por papéis cômicos. Sou uma assalariada. Quem sou eu para negar trabalho?’
— Antes da TV, fiz “Medeia”, “Antígona” e Nelson Rodrigues no teatro. O meu filme anterior, “TOC — Transtornada, obsessiva, compulsiva” tinha uma pegada de comédia e foi bem recebido pela crítica, mas o público não gostou. Teve gente que falou: “Tatá, vou te ver para rir, não para fazer uma reflexão” (o longa é sobre uma atriz muito famosa que entra em crise com a profissão). Para fazer drama, preciso de convites.
Prestes a completar 35 anos, em agosto, a atriz vai adiar por mais um tempo o desejo de ter um filho para dar conta da intensa agenda profissional. Após encerrar a novela “Deus salve o rei”, no dia 30, na Globo, tira dez dias de férias. Mas quer aproveitar o descanso para começar a escrever o roteiro da nova temporada do “Lady night”. Entre os novos convidados, Caetano Veloso. Em outubro, ela começa a gravar “Bugados”, nova série de Fernanda Young e Alexandre Machado para a Globo — sua personagem vive o dilema de se expor nas redes sociais sem perder a privacidade.
Nesta entrevista, Tatá, que também vai rodar no fim do ano um filme em que formará uma dupla sertaneja com Ingrid Guimarães, fala das críticas e de como superou o machismo no humor.
Você estará em uma série na Globo, vai para a terceira temporada de seu talk-show no Multishow, é protagonista de filmes e novelas. Chegou aonde queria?
Muito mais do que imaginei. Minha vontade era não deixar de ser atriz e simplesmente conseguir me manter na profissão. No processo, me descobri apresentadora com o “Lady night”, que é um programa autoral. Lá, posso fazer um pouco de tudo. O programa tem o meu jeito.
Como será “Bugados”?
Já fizemos leituras, e estou adorando o texto. São três casais que passam por situações cotidianas e lidam de forma irônica com a vida. Rita, minha personagem, é deslumbrada com a internet. Quer a privacidade dela, mas se expõe nas redes.
A tal da vida perfeita nas redes sociais...
Pois é, vejo os feeds das pessoas só com uma paleta de cores determinadas. Não tenho condição de ter essa vida cor-de-rosa! A minha não é assim. Para fazer uma selfie maneira eu tiro 50 fotos. Às vezes o Rafa (Vitti, seu namorado) me manda uma, e ele é lindo. Pois eu preciso botar filtro, levantar a perna, fazer várias coisas para ficar decente.
O Rafael Vitti tem 22 anos. Você se assustou com a repercussão quando começou seu namoro com ele?
Eu não gostei de um cara mais novo, gostei do Rafa. Quando um homem está com uma mulher mais nova é quase um troféu. Chegaram a me passar trotes mandando eu ficar com alguém da minha idade. Antes dele, me relacionei com homens mais velhos.
No filme, sua personagem precisa se mostrar durona para conseguir investigar um crime com um parceiro, um homem. Você enfrentou machismo no humor?
Eu vim de um ambiente de campeonato de improviso e lá precisava me anular como mulher. Tinha que negar minha feminilidade mesmo, usar roupas largas, para ser respeitada. Ouvi muita piadinha.
Chegou a ser assediada?
Já passei por situações. A gente ainda vive numa cultura machista. Percebo resquícios de machismo em mim mesma. Mas estamos no meio de uma mudança rápida. No filme, em uma cena, a Keyla faz xixi em pé. Ok, ela é uma pessoa prática. Mas se fosse fazer hoje (a cena) eu argumentaria que não há mais necessidade disso.
Você se considera empoderada?
O meu empoderamento vem do fato de eu ser uma mulher independente. Sou fiel ao que quero fazer.
Qual balanço você faz de sua participação em “Deus salve o rei”?
Aprendi muito. Essa foi uma novela com uma linguagem e um figurino próprios. Quando fico dois dias sem gravar já me sinto fora daquele universo medieval. No texto da Lucrécia vinha: chora copiosamente, tem um acesso de fúria e ri descontroladamente. Tudo numa mesma cena!
Acha que suas personagens nas novelas são parecidas?
Elas estão num nicho das malucas, desequilibradas, ninfomaníacas. Dentro disso, tentei dar uma cor diferente a cada uma. Mas é difícil sair do rótulo. Nas novelas, minha demanda tem sido por papéis cômicos. Sou uma assalariada. Quem sou eu para negar trabalho?
A sua dicção acelerada nas novelas também já foi criticada...
Em “Deus salve o rei” não é assim. No “Lady night” eu falo rápido mesmo. As pessoas não entendem isso como recurso de humor. O Pedro Cardoso faz o mesmo.
Como foi contracenar com Cauã? Você brincou que não faria sentido fazer o filme com ele sem cena de beijo...
Cauã é brilhante, fez muitos dramas e não atuava em comédia há anos. Admiro a disponibilidade dele em se colocar num lugar diferente. Ser muito bonito é a última de suas qualidades. Mas não posso negar que ficava com uma certa cerimônia perto dele. E tive que tirar dois dentes de trás para me sentir segura em nossa cena de beijo.
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