Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Arthur Azevedo quarta, 09 de novembro de 2016

PLEBISCITO - ARTHUR AZEVEDO, ESCRITOR MARANHENSE

PLEBISCITO - ARTHUR AZEVEDO

Raimundo Floriano

 

 

                        Arthur Azevedo é o maior vulto do Teatro Brasileiro!

 

                        Arthur Nabantino Gonçalves de Azevedo, nascido em São Luís do Maranhão, a 7 de julho de 1855, e falecido no Rio de Janeiro a 22 de outubro de 1908, com apenas 53 anos, dramaturgo, contista, poeta comediógrafo e jornalista, irmão mais velho de Aluísio Azevedo, este autor de O Cortiço e O Mulato, é uma das grandes figuras da Literatura Brasileira, em cuja obra campeia um fino e gracioso humorismo.

 

                        Seguiu para o Rio de Janeiro em 1873, aos 18 anos de idade, onde foi tradutor de folhetins e revisor de A Reforma, tornando-se conhecido por seus versos humorísticos. Escrevendo para o teatro, alcançou enorme sucesso com as peças Véspera de Reis e A Capital Federal, esta musical.

 

                        Dentre seus trabalhos, destacam-se Contos Possíveis, Contos Efêmeros, Contos Fora de Moda, Contos em Verso, Contos Cariocas e Vida Alheia. Espalhou também sua verve em dezenas de revistas teatrais e de esfuziantes comédias, entre as quais sobressaem O Dote, A Almanjarra, O Oráculo, Vida e Morte, Entre a Missa e o Almoço, Entre o Vermute e a Sopa, Retrato a Óleo e O, Amor por Anexins. Trabalhou nos principais jornais da época, no Rio de Janeiro, tendo fundado e dirigido A Gazetinha, Vida Moderna e O Álbum.

 

                        Foi Fundador da Academia Brasileira de Letras e titular da Cadeira número 29, para a qual tomou Martins Penna como patrono.

 

                        No final dos Anos 1960, foi apresentada aqui em Brasília a peça musical de sua autoria, A Capital Federal, com produção de Cleyde Yaconis e grande elenco de 27 artistas, dentre os quais Etty Fraser, Suely Franco, Neuza Borges, Tamara Taxman e Carlos Alberto Riccelli, além de excelente orquestra, que considero o melhor espetáculo musical a que assisti em toda minha vida. A peça causou tal impressão em mim que, ao fundar a primeira banda carnavalesca brasiliense, em 1972, dei-lhe o nome de Banda da Capital Federal.

 

                        Possuo em meu acervo literário toda a obra desse grande gênio intelectual conterrâneo e, para fazê-la um pouco conhecida por todos vocês, meus diletos leitores, estarei, vez em quando, aqui neste Almanaque, trazendo à baila uma de suas magistrais criações, começando a partir de agora, com tema muito em voga nos tempos atuais.

 

                        O texto a seguir foi extraído do livro Contos Fora da Moda, encontrável hoje em sebos virtuais, assim como diversas itens de sua vasta produção literária.

 

 

PLEBISCITO

 

                        A cena passa-se em 1890.

 

                        A família está toda reunida na sala de jantar.

 

                        O Senhor Rodrigues palita os dentes, repimpado numa cadeira de balanço. Acabou de comer como um abade.

 

                        Dona Bernardina, sua esposa, está muito entretida a limpar a gaiola de um canário belga.

 

                        Os pequenos são dois, um menino e uma menina. Ela distrai-se a olhar para o canário. Ele, encostado à mesa, os pés cruzados, lê com muita atenção uma das nossas folhas diárias.

 

                        Silêncio!

 

                        De repente, o menino levanta a cabeça e pergunta:

 

                        – Papai, que é plebiscito?

 

                        O Senhor Rodrigues fecha os olhos imediatamente para fingir que dorme.

 

            ‘           O pequeno insiste:

 

                        – Papai?

 

                        Pausa!

 

                        – Papai?

 

                        Dona Bernardina intervém:

 

                        – Ó Seu Rodrigues, Manduca está lhe chamando. Não durma depois do jantar, que lhe faz mal.

 

                        O Senhor Rodrigues não tem remédio, senão abrir os olhos.

 

                        – Que é? Que desejam vocês?

 

                        – Eu queria que papai me dissesse o que é plebiscito.

 

                        – Ora essa, rapaz! Então tu vais fazer doze anos e não sabes ainda o que é plebiscito?

 

                        – Se soubesse, não perguntava.

 

                        O Senhor Rodrigues volta-se para Dona Bernardina, que continua muito ocupada com a gaiola:

 

                        – Ó senhora, o pequeno não sabe o que é plebiscito!

 

                        – Não admira que ele não saiba, porque eu também não sei.

 

                        – Que me diz?! Pois a senhora não sabe o que é plebiscito?

 

                        – Nem eu, nem você; aqui em casa ninguém sabe o que é plebiscito.

 

                        – Ninguém, alto lá! Creio que tenho dado provas de não ser nenhum ignorante!

 

                        – A sua cara não me engana. Você é muito prosa. Vamos: se sabe, diga o que é plebiscito! Então? A gente está esperando! Diga!...

 

                        – A senhora o que quer é enfezar-me!

 

                        – Mas, homem de Deus, para que você não há de confessar que não sabe? Não é nenhuma vergonha ignorar qualquer palavra. Já outro dia foi a mesma coisa quando Manduca lhe perguntou o que era proletário. Você falou, falou, falou, e o menino ficou sem saber!

 

                        – Proletário – acudiu o Senhor Rodrigues – é o cidadão pobre que vive do trabalho mal remunerado.

 

                        – Sim, agora sabe porque foi ao dicionário; mas dou-lhe um doce, se me disser o que é plebiscito sem se arredar dessa cadeira!

 

                        – Que gostinho tem a senhora em tornar-me ridículo na presença destas crianças!           

 

                        – Oh! Ridículo é você mesmo quem se faz. Seria tão simples dizer: – Não sei, Manduca, não sei o que é plebiscito; vai buscar o dicionário, meu filho!

 

                        O Senhor Rodrigues ergue-se de um ímpeto e brada:

 

                        – Mas se eu sei!

 

                        – Pois se sabe, diga!

 

                        – Não digo para me não humilhar diante de meus filhos! Não dou o braço a torcer! Quero conservar a força moral que devo ter nesta casa! Vá para o diabo!

 

                        E o Senhor Rodrigues, exasperadíssimo, nervoso, deixa a sala de jantar e vai para o seu quarto, batendo violentamente a porta.

 

                        No quarto, havia o que ele mais precisava naquela ocasião: algumas gotas de água de flor de laranja e um dicionário...

 

 

                        A menina toma a palavra:

 

                        – Coitado de papai! Zangou-se logo depois do jantar! Dizem que é tão perigoso!

 

                        – Não fosse tolo – observa Dona Bernardina – e confessasse francamente que não sabia o que é plebiscito!

 

                        – Pois sim – acode Manduca, muito pesaroso por ter sido o causador involuntário de toda aquela discussão – pois sim, mamãe; chame papai e façam as pazes.

 

                        – Sim! Sim! façam as pazes! – diz a menina em tom meigo e suplicante. – Que tolice! Duas pessoas que se estimam tanto zangaram-se por causa do plebiscito!

 

                        Dona Bernardina dá um beijo na filha, e vai bater à porta do quarto:

 

                        – Seu Rodrigues, venha sentar-se; não vale a pena zangar-se por tão pouco.

 

                        O negociante esperava a deixa. A porta abre-se imediatamente.

 

                        Ele entra, atravessa a casa, e vai sentar-se na cadeira de balanço.

 

                        – É boa! – brada o Senhor Rodrigues depois de largo silêncio – é muito boa! Eu! Eu ignorar a significação da palavra plebiscito! Eu!...

 

                        A mulher e os filhos aproximam-se dele.

 

                        O homem continua num tom profundamente dogmático:

 

                        – Plebiscito...

 

                        E olha para todos os lados a ver se há ali mais alguém que possa aproveitar a lição.

 

                        – Plebiscito é uma lei decretada pelo povo romano, estabelecido em comícios.

 

                        – Ah! – suspiram todos, aliviados.

 

                        – Uma lei romana, percebem? E querem introduzi-la no Brasil! É mais um estrangeirismo!...

 

 

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