Apesar de não constar em nenhum dicionário da língua portuguesa, a palavra “timote” faz parte do Dicionário de Gírias Nordestinas de BY MIA, que assim se expressa:
Timote – Diz-se da pessoa que não segue padrões sociais de beleza; sinônimo de horroroso. Variações: atimotado, timotento.
Entretanto, no interior nordestino esse vocábulo tem vários significados. Tanto pode ser a pessoa feia, chata, metida, bajuladora, idiota, como a pessoa desastrada, golpista, desonesta, cuja presença é sempre indesejável. “Timote” é um termo pejorativo. Aplica-se ao homem ou à mulher.
Realmente, em quase todas as famílias, ricas ou pobres, sempre há um membro desastrado ou idiota, que destoa do restante dos parentes, passando a ser apontado, como o “timote” da família. É o parente trabalhoso, que vive nas costas dos outros; é o filho que não trabalha nem quis estudar; o que não ouve conselho e só se acompanha de quem não presta, e também aqueles que se desviam para os vícios.
O “timote” acaba sendo um estorvo para a família, especialmente para os pais.
Às vezes, a família é rica e poderosa e consegue infiltrar o “timote” na política.
Outras vezes, o “timote” arranja um casamento com alguma moça mais velha e rica, e termina se dando muito bem.
Pois bem. Desde menina, Malvina ouvia sua mãe dizer que em toda família havia um “timote” para atanazar.
Já moça feita, passou a ouvir da mãe essa recomendação:
– Quando arranjar um namorado, mesmo que ele seja rico e bem nascido, procure ter certeza de que ele não é o “timote” da família”.
Talvez por isso, Malvina passou a mocidade escolhendo marido, com medo de arranjar um “timote”. O tempo passou e ela se transformou numa balzaquiana muito pudica.
Já beirando os 40 anos, aceitou um pedido de casamento de Virgulino, um rapaz de 35 anos, filho de um fazendeiro rico da cidade, que tinha passado 10 anos no Rio de Janeiro e agora retornara.
O casamento foi por pura conveniência. Malvina queria sair da condição de “encalhada”. Achou Virgulino um grande partido. Mas se enganou redondamente. Virgulino era o “timote” da família. Viveu no Rio de Janeiro uma vida de orgias, recebendo mesada do pai, que preferia vê-lo distante.
Na noite de núpcias, a noiva sofreu uma grande decepção. O noivo comeu e bebeu muito na festa do casamento e adormeceu profundamente, deixando-a no “ora, veja”. Teve de dormir também.
No dia seguinte, a cena se repetiu. Virgulino comeu feito um bicho e bebeu exageradamente. Mostrou que era “bom de cama”, pois dormiu quase 24 horas. Usava a cama somente para dormir. Além disso, roncava feito um porco.
Malvina não sabia se sorrisse ou se chorasse, diante daquela situação ridícula por que estava passando.
Os sonhos fantasiosos que alimentava para a noite de núpcias e para toda a sua vida em comum com Virgulino, desapareceram como por encanto.
E o noivo continuou completamente frio para ela. Passaram a lua de mel, indiferentes um ao outro. A decepção da moça foi grande e logo ela se convenceu de que Virgulino, na verdade, era o “timote” da família dele. Casara com ela, por interesse financeiro.
E lembrou-se das palavras fatídicas da sua saudosa mãe:
” Quando arranjar um namorado, procure saber se ele é o “timote” da família.”
Virgulino nem sequer tentou cumprir a “obrigação do matrimônio”. A “noiva” continuou incólume.
Pouco tempo depois, veio à tona uma inesperada realidade: Virgulino tinha um romance com um rapaz do Rio de Janeiro, que chegara na cidade, para fixar residência.
A chocante descoberta desse lado de Virgulino juntou-se à aversão sexual, que, claramente, ele demonstrava pela esposa.
O fato resultou na anulação do casamento, por erro essencial de pessoa, prevista no artigo 1.557 do Código Civil Brasileiro, postulada por Malvina.