Durante a entrevista coletiva em que anunciou os convocados para os próximos jogos da seleção pelas Eliminatórias, ontem, Tite foi informado de que se tratava do Dia Nacional do Treinador de Futebol. E então permitiu-se o gracejo: “Parabéns para os 210 milhões de técnicos do Brasil”. A lista mal havia sido divulgada e já era possível perceber o descontentamento. Por que Philippe Coutinho voltou a ter uma chance? O que fez Daniel Alves para merecer ser chamado? E Everton Ribeiro? Cadê Guilherme Arana? Raphael Veiga por acaso joga vôlei? Hulk nasceu na Austrália?
Pacientemente, como faz há quase seis anos, Tite gastou mais de uma hora respondendo a perguntas sobre sua convocação. Ao contrário do que costumam fazer alguns de seus pares e antecessores, o técnico da seleção não interdita debates e não se opõe a falar sobre suas escolhas. É aqui que o treinador produz — inadvertida e desnecessariamente — provas contra si próprio.
Philippe Coutinho jogou pouco no segundo semestre de 2021 pelo Barcelona, não teve espaço com o técnico Xavi e virou um estorvo financeiro para o clube. É bem fácil encontrar reportagens na imprensa da Catalunha que o catalogam como “pior contratação da história do clube” (um exagero e uma injustiça). Numa tentativa de voltar a ser o jogador que já foi, o meia de 29 anos acaba de topar ser emprestado para o Aston Villa, 14º colocado do Campeonato Inglês. Ou seja, é difícil concordar com Tite quanto a Coutinho estar “recuperando seu melhor nível”. Mas isso não é importante.
Ao técnico da seleção brasileira, seja ele quem for, deveria ser permitida uma cota de teimosia — até por ser impossível alcançar a unanimidade entre 210 milhões de outros técnicos. Foi sob Tite, antes da Copa do Mundo de 2018, que Coutinho jogou seu melhor futebol. Se o treinador entende que algum tipo de ajuda ao jogador neste momento pode significar uma recompensa a seu time na Copa do Mundo em novembro, isso deveria bastar para justificar sua convocação.
No mais, a lista com 26 nomes (e sem Neymar, machucado) ajuda pouco a prever qual será o grupo da Copa do Mundo — e ainda faltam pelo menos mais três convocações até o Qatar. De chocante, mesmo, só o fato de que Renan Lodi perdeu a oportunidade de disputar uma vaga na seleção porque não se vacinou contra a Covid-19. A CBF acertou ao não chamá-lo. Neste caso específico, o discurso de Tite foi perfeito.